Ao negociar e conseguir com o governo Bolsonaro a publicação da Medida Provisória 984, que permite agora aos clubes vender os direitos de transmissão dos seus jogos quando forem os mandantes das partidas sem mais ter contrato com a mesma emissora do adversário, o Flamengo quer dar um "salto para o futuro", segundo o vice-presidente de Relações Externas, Luiz Eduardo Baptista, mais conhecido como Bap.
"Hoje estamos presos a paradigmas do passado", disse o dirigente, sem se importar com as críticas dos rivais de que o MP foi editada quase que exclusivamente para beneficiar o clube rubro-negro. "Dizer que esse assunto não estava sendo discutido antes da MP é uma mentira descarada", atacou.
Bap também defende que, como as finanças dos clubes no Brasil depende dos jogos, foi fundamental retomar as partidas do Campeonato Carioca o mais rápido possível. "Quem bota dinheiro no futebol, que são os patrocinadores, quer previsibilidade".
Confira a entrevista dada ao Estadão:
Como o senhor avalia o impacto financeiro da Medida Provisória 984 que altera as regras de direitos de transmissão?
A gente discute essa questão dos direitos de transmissão há pelo menos 21 anos. Desde a aprovação da Lei Pelé ninguém concordou que aquela seria a melhor legislação. Em pelo menos três ocasiões tivemos a oportunidade de reabrir essa discussão no Congresso Nacional, mas, por uma série de razões, isso não aconteceu. Quando a Lei Pelé foi redigida, em 1998, não existia Amazon, Google, Facebook, Netflix, WhatsApp, YouTube, Uber... A lei não poderia ficar estática e a estrutura de transmissão esportiva no Brasil mudou. Do que jeito que estamos hoje, não conseguimos dar um salto para o futuro porque estamos presos a paradigmas do passado que não foram atualizados dentro da revolução tecnológica que vivemos nos últimos 15 anos. Isso precisava ser ajustado.
Mas nem são todos os clubes estão elogiando a MP.
Esse é um problema que estava demandando atenção há mais de 10 anos. Dizer que esse assunto não estava sendo discutido antes da MP é uma mentira descarada. Não à toa, sete clubes da Série A do Campeonato Brasileiro resolveram assinar contrato com o Esporte Interativo. Se o negócio estava tão bom como estão dizendo aí, sete de 20 clubes da Primeira Divisão não teriam feito o que fizeram. Levantamos esse assunto por causa especificamente do Campeonato Carioca. É uma contribuição do Flamengo ao futebol. O Brasil inteiro não estaria discutindo a questão dos direitos de transmissões esportivas se não fosse a Medida Provisória. Todo mundo pode vir a público dizer o que acha sobre o assunto. Essa é a oportunidade para todo mundo se engajar. Agora é a hora.
Como o senhor vê as críticas de que a MP foi feita quase que exclusivamente para o Flamengo?
O único clube que não tinha contrato para transmitir os seus jogos é o Flamengo. Por isso estão chamando de MP do Flamengo. O que o Flamengo conseguiu vai durar 120 dias, é provisório. Nenhum outro clube tem direito de TV para vender agora. Tem clube com contrato assinado até 2024. Do que eles estão reclamando? Eu consegui vender limão em Marte. Os outros clubes não estão em Marte e não têm limão. Estão se queixando do quê?
A MP não vai acabar beneficiando só os grandes clubes?
Todo mundo tem acesso ao mercado. Alguns clubes souberam se adaptar muito bem sem ter o tamanho do Flamengo. Vejam o trabalho de Bahia, Ceará, Fortaleza, Red Bull, Athletico-PR, Goiás... Com o dinheiro que eles têm, são motivo de exemplo para nós. A gente olha e aplaude. Competência não tem relação com tamanho ou faturamento. A beleza do negócio está na competência associada às multiplataformas que permitem que você exponha o seu produto.
A volta do Campeonato Carioca não foi precipitada?
Sabemos que não vai ter uma solução definitiva a covid-19 em menos de um ano. Então, a gente vai ficar em casa, vendo a vida passar, sem fazer nada? A vida tem de continuar porque não temos a vacina. Muita gente confundiu planejamento para a retomada com uma forma açodada de querer voltar aos jogos. Avaliamos o futebol na Europa e aprendemos que não adiantava ficar sentado esperando o plano perfeito porque o conhecimento pleno da covid-19 ainda não está concluído. Aqui, hospitais de campanha e toda estrutura que, em tese, deveria ser montada já começaram a ser desativados.
O que chama atenção é que o Flamengo liderou esse processo para retomada praticamente sozinho.
Lideramos, convencemos, mas dentro da federação do Rio tiverem 16 clubes participando desse processo, sendo que 14 concordaram e somente dois não. Queríamos voltar a jogar e fomos atrás da autorização das autoridades para montar um protocolo. O fato de a gente ter sido proativo e planejado não significa que somos insensíveis ou estávamos descumprindo alguma lei. Fizemos tudo em conformidade com as autoridades.
Financeiramente também era importante voltar com os jogos?
Quem bota dinheiro no futebol, quem paga salário de jogador, que são os patrocinadores, quer previsibilidade. Dizer para quem lhe ajuda financeiramente que você não sabe quando vai entregar o produto que ele espera acaba em cancelamento de contrato.
Mas, antes mesmo da volta do Carioca, o Flamengo teve de recorrer a empréstimo bancário. O clube está em dificuldades financeiras?
Não sabíamos quanto tempo duraria a paralisação dos jogos. É como entrar em um avião e não saber quanto tempo você vai voar. Nós, então, resolvemos colocar o máximo de combustível que cabia no tanque para não sermos pegos de surpresa. Ainda bem que pegamos esse dinheiro porque conseguimos pagar salários e impostos. Foi uma decisão para proteger o caixa, e não um problema de natureza econômica. Do ponto de vista financeiro, o Flamengo vai muito bem, obrigado.