Com dívida de R$ 799 milhões até 2019, segundo seu balanço, e previsão de déficit de R$ 143 milhões em 2020, o Cruzeiro tenta escolher o melhor caminho para começar a recuperar a viabilidade financeira. Eleito presidente em 21 de maio e à frente da administração desde 1º de junho, Sérgio Santos Rodrigues destaca que a as prioridades iniciais são manter os salários de jogadores e funcionários em dia e liquidar pendências com clubes na Fifa.
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“Talvez sejamos um dos cinco clubes do Brasil com salário em dia. Não devemos nadas a nossos atletas. Isso demonstra nosso esforço e compromisso nessa viabilização”, afirma o dirigente, em entrevista ao Superesportes/Estado de Minas. Segundo ele, os compromissos foram honrados com “receitas de patrocínio e transferência de jogadores”.
Uma das vendas recentes do Cruzeiro foi a de Edu, ao Athletico-PR, por 500 mil dólares (R$ 2,5 milhões). A diretoria utilizou o recurso para quitar uma das folhas salariais e manteve em propriedade do clube 15% dos direitos econômicos do zagueiro de 20 anos. O Furacão, que chegou a perguntar por Cacá em janeiro, desembolsou pequena fatia da fortuna de R$ 47 milhões (8 milhões de euros) da transferência de Robson Bambu para o Nice, da França.
Com orçamento apertado devido à pandemia do novo coronavírus, o Cruzeiro considera negociar outros atletas. “É uma realidade, sem dúvida alguma. O jogador é o principal ativo em curto prazo de um clube. Claro que tentaremos uma venda parcial, ou uma venda na qual o atleta possa ficar aqui. O objetivo maior é pagar o salário em dia e pagar a Fifa. Se precisar vender atletas, vamos vender. Qualquer um”, ressalta Sérgio Rodrigues.
Todavia, o mandatário garante que não pretende abrir mão de jogadores por valores aquém do ideal. “Tivemos propostas recentes recusadas por atletas do Cruzeiro. O comprador se colocou na posição de que ‘poxa, o Cruzeiro está precisando’. Hoje não preciso, minha folha está em dia. Pode ser que em 15 dias eu precise, não sei. Sempre vamos tentando buscar outras alternativas”.
Em 2019, o Cruzeiro arrecadou R$ 108 milhões com transferências de atletas, entre as quais as de Arrascaeta (Flamengo, por R$ 55,2 milhões), Raniel (São Paulo, por R$ 13 milhões), Murilo (Lokomotiv Moscou, da Rússia, por R$ 8,1 milhões), Lucas Romero (Independiente, da Argentina, por R$ 8,8 milhões), Gabriel Brazão (Parma, da Itália, por R$ 11 milhões) e Vitinho (Cercle Brugge, da Bélgica, por R$ 10 milhões).
O fato de o clube disputar a Série B em 2020 tende a gerar desvalorização em direitos econômicos de atletas, mas Sérgio já traça planos para a volta do Cruzeiro à primeira divisão e vislumbra vendas vultosas.
“Quando fui (superintendente) de negócios internacionais da base do Cruzeiro, viajei duas vezes com o time. Um dos torneios que ganhamos, na Eslováquia, tínhamos o Lucas França (goleiro), o Bruno Viana (zagueiro), que está em Portugal; o Fabrício Bruno (zagueiro), no Bragantino; o Roni (atacante), no Palmeiras. Se você pegar um time de 11, quatro estão no profissional e bem, já mostramos o que é o Cruzeiro. Temos potencial para desenvolver isso sim”.
Em 2019, o Flamengo liderou o ranking de receitas com vendas de direitos econômicos ao faturar R$ 300 milhões. Em seguida aparecem Santos, R$ 216 milhões; Internacional, R$ 136 milhões; e Athletico-PR, R$ 133 milhões. Palmeiras, Cruzeiro e São Paulo embolsaram R$ 108 milhões, enquanto o Atlético arrecadou R$ 106 milhões.
Dívidas na Fifa
O Cruzeiro iniciará a Série B com menos seis pontos em razão de uma punição disciplinar aplicada pela Fifa. O clube não pagou 850 mil euros (R$ 5 milhões) ao Al Wahda, dos Emirados Árabes Unidos, pela contratação por empréstimo do volante Denílson, em julho de 2016.
Nesta terça-feira, o Cruzeiro informou ter recebido mais duas ordens de pagamento: uma de US$ 2.286.840,00 (R$ 11.968.405,82), pela compra de Rafael Sobis ao Tigres do México, e outra de 395.619 euros (R$ 2.335.814,08), no empréstimo de Pedro Rocha junto ao Spartak Moscou, da Rússia. Somados em moeda nacional, os valores correspondem a R$ 14,3 milhões.
O Cruzeiro tem até 15 de julho para quitar a dívida por Sobis. O prazo da pendência por Pedro Rocha é 6 de agosto. Diferentemente do “caso Denilson”, segundo comunicado do clube, as penalidades são o impedimento de registro de atletas, até que as situações sejam resolvidas. Não há, portanto, risco de nova perda de pontos, nem rebaixamento de divisão. Enquanto isso, a diretoria tenta negociar diretamente com os credores.
“Há clubes cuja dívida não está vencida, e a Fifa tem o procedimento de intimar a pagar num prazo entre 30 e 90 dias. Há clubes que essa dívida não venceu que negociamos direitos de atletas. Outros estão aceitando parcelamento. A de curto prazo, necessária para se pagar para evitar punição esportiva, é a Fifa. Tirou-se a Fifa, todas as outras dívidas são negociáveis, dentro do sistema jurídico brasileiro”, salientou Santos Rodrigues.
Em 28 de maio, a Raposa se livrou de nova perda de pontos ao pagar 600 mil euros (R$ 3,5 milhões) ao Zorya, da Ucrânia, pela aquisição dos direitos econômicos do atacante Willian, em julho de 2014. Ainda há 1 milhão de euros (R$ 5,96 milhões) que serão discutidos pelo Tribunal Arbitral do Esporte no segundo semestre de 2020.
No dia 14 de abril, o núcleo de gestores que administrou o Cruzeiro no primeiro semestre calculou as dívidas na Fifa em R$ 81,4 milhões. Os valores inflacionaram devido à desvalorização do real frente ao dólar e ao euro. Como comparação, em 31 de janeiro o passivo era de R$ 53 milhões.
Demais débitos
Relatório da Ernst & Young com base no balanço feito pela consultoria Moore arredondou a dívida do Cruzeiro para R$ 799 milhões, sendo R$ 338 milhões de ordem tributária, R$ 142 milhões em empréstimos/financiamentos e R$ 319 milhões entre salários, comissões, aquisições de jogadores e demais espécies.
Conforme o presidente Sérgio Rodrigues, débitos trabalhistas, bancários e de outras espécies são mais passíveis de negociação, o que não ocorre nas sanções aplicadas pela Fifa.
“O ato trabalhista você só faz quando existe a execução trabalhista. Execução o Cruzeiro tem poucas, porque a maioria das ações decorrem da última gestão. São processos em curso. Por isso em muitos nós temos procurado e falado: ‘nos dê o fôlego, porque vamos fazer acordo com todo mundo’. Não temos o objetivo de não pagar ninguém. O objetivo é conseguir um faturamento viável para negociar isso”.
A entrevista
Sérgio Santos Rodrigues concedeu entrevista exclusiva ao Superesportes/Estado de Minas. Na conversa, presidente do Cruzeiro falou sobre finanças, contratações, patrocínios, entre outros temas relacionados ao início de sua gestão. Veja o que já publicamos: