Marcaram presença na Assembleia Legislativa os conselheiros Dalton Loredo, Anísio Ciscotto (ex-presidente do Conselho Fiscal), Giovanni Baroni (ex-candidato à vice-presidência do Cruzeiro e ex-integrantes do Conselho Gestor criado por Zezé Perrella) e Gustavo Gatti (ex-secretário do Conselho Deliberativo e um dos principais líderes da oposição).
Para uma CPI ser instaurada na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), são necessários votos de 26 parlamentares, que correspondem a 1/3 da bancada total. Conforme o artigo 112 do Regimento Interno, o requerimento é recebido e analisado pela presidência - função ocupada por Agostinho Patrus (PV).
Integrada por sete deputados efetivos e sete suplentes, a CPI tem poderes de investigação próprios de autoridades judiciais, podendo requisitar informações, documentos e serviços, bem como ouvir indiciados e interrogar testemunhas.
No caso do Cruzeiro, por se tratar de uma instituição privada, a Comissão Parlamentar de Inquérito só seria realizada mediante intervenção do Ministério Público. Além disso, as investigações são conduzidas de acordo com as prioridades da Assembleia, podendo essa CPI ser colocada “no meio da fila”.
Denúncias
Em 26 de maio, o programa Fantástico, da TV Globo, denunciou casos de corrupção da diretoria do Cruzeiro, envolvida em esquemas de lavagem de dinheiro, falsificação de documentos e falsidade ideológica, além de quebras de regra da Fifa, da Confederação Brasileira de Futebol e do Governo Federal.
Os principais dirigentes investigados pela Polícia Civil eram o presidente Wagner Pires de Sá, o ex-vice de futebol Itair Machado, o ex-diretor-geral Sérgio Nonato e o diretor jurídico Fabiano de Oliveira Costa. À época, vieram à tona irregularidades em transações e valores superfaturados pagos a empresas prestadoras de serviço.
O fato mais grave era sobre um empréstimo de R$ 2 milhões contraído pelo Cruzeiro com o empresário Cristiano Richard dos Santos Machado, sócio de firmas que atuam na locação de veículos e de equipamentos de proteção.
Para abater o débito, o clube, segundo inquérito da Polícia Civil, incluiu parte dos direitos de jogadores do profissional, como David (20%), Raniel (5%), Murilo (7%), Cacá (20%), e de outros que passaram pela base e foram negociados, casos de Gabriel Brazão (20%) e Vitinho (20%).
O Cruzeiro ainda inseriu participação em uma possível venda do promissor Estevão William, de apenas 12 anos, que, pelas leis trabalhistas, só poderá assinar vínculo laboral a partir dos 16.
A Polícia Civil também apurou aumentos substanciais nos salários de dirigentes (Sérgio Nonato chegou a embolsar mensalmente R$ 125 mil), a contratação de conselheiros para prestação de serviços e o pagamento a torcidas organizadas.
O caos político e administrativo refletiu no futebol. No Campeonato Brasileiro, o Cruzeiro fez a sua pior campanha na era dos pontos corridos e caiu para a segunda divisão em 17º lugar, com 36 pontos em 38 rodadas. Pela primeira vez, o clube disputará a Série B. Em meio ao maior vexame esportivo, a agremiação lida com atrasos de salários e dívida que pode chegar a R$ 700 milhões, quase o dobro de sua arrecadação.
Apesar dos vários protestos de torcedores, Wagner Pires de Sá segue resistente e garante que não renunciará ao mandato no Cruzeiro, previsto para terminar em dezembro de 2020. Nessa sexta-feira, ele destituiu Zezé Perrella da função de gestor de futebol e nomeou Márcio Rodrigues como novo vice-presidente de futebol.
Bahia
Em 2013, o Bahia passou por um processo semelhante ao almejado pela torcida do Cruzeiro. À época, foi criada uma CPI para investigar a administração do então presidente Marcelo Guimarães Filho, conhecido como Marcelinho. Com ele na presidência, o clube negociou atletas das categorias de base por valores baixos e realizou mais de 100 contratações em três anos. Houve ainda suspeitas de fraude no processo eleitoral por meio de votos de ‘sócios-fantasmas’.
A CPI chegou a ter 24 assinaturas - o mínimo necessário eram 21 -, porém vários parlamentares retiraram seus nomes depois de Marcelo Guimarães ameaçar denunciar supostas irregularidades do governo nas suas ligações com os times de futebol do estado.
Se na Assembleia não houve o prosseguimento da CPI, os próprios conselheiros do Bahia se mobilizaram contra Marcelinho por meio de ações judiciais. Além de ter sido expulso do quadro de sócios da agremiação, o ex-dirigente respondeu por formação de quadrilha e foi condenado a pagar R$ 50 mil por danos morais ao juiz Paulo Albiani, responsável pelo processo de intervenção em 2013. Em 2016, o Bahia cobrou R$ 44 milhões de Marcelo Guimarães como ressarcimento de valores gastos indevidamente.
Após a saída de Marcelo Guimarães, o Bahia se organizou financeiramente e conseguiu reduzir a dívida geral de R$ 223 milhões, em 2014, para R$ 182 milhões, em 2018. Cerca de 60% do passivo tem prazo de pagamento em longo prazo. Também foi registrado crescimento nas receitas, especialmente por aumento de cotas de televisão e transferências de jogadores: de R$ 76 milhões para R$ 136 milhões em cinco anos.