No documento, conselheiros levantaram informações divulgadas na imprensa para embasar o pedido de investigação. Eles citam dívidas do clube na Fifa na ordem de R$ 50 milhões, a compra do desconhecido Latorre por R$ 12 milhões e o dinheiro gasto com o atacante Ramón Ábila, que ficou pouco tempo no Cruzeiro, antes de ser negociado com o Boca Juniors, entre outros casos, como as contratações de Pisano, Caicedo e Sánchez Miño.
Ao Superesportes, Guilherme Oliveira Cruz disse que quer transparência no Cruzeiro.
Vice de futebol entre setembro de 2015 e outubro deste ano e responsável por parte das contratações questionadas, Vicintin foi citado no documento e decidiu quebrar o silêncio. Durante quase 40 minutos, ele falou pontualmente sobre diversos casos.
Leia, na íntegra, as questões indagadas a Vicintin pela imprensa:
Divulgação da carta de Guilherme Oliveira Cruz
Para minha surpresa, agora à tarde eu recebi uma carta do senhor Guilherme Cruz, questionando uma série de fatos ao Conselho sobre minha administração no departamento de futebol.
O gestor de futebol faz contratações certas e erradas. Isso faz parte. Eu acertei e errei, como em contratações do Sanchez Mino e do Gino, como ele mesmo cita. Mas acertei nas contratações do Thiago Neves, Diogo Barbosa, Robinho, Romero e várias outras. Inclusive, eu acho que uma razão de eu ter acertado foi a conquista do pentacampeonato da Copa do Brasil.
Passei a carta aos meus advogados e vou tomar as medidas cabíveis, porque eu acho que posso ser questionado sobre os erros que cometi, mas não posso ser questionado sobre minha idoneidade. Isso eu não aceito. Eu não devo só satisfação ao conselho do Cruzeiro. Eu devo satisfação à minha família, da qual eu deixei de conviver por cinco anos e meio de forma voluntária, sem receber um real e tirando dinheiro do bolso. Recebi o Cruzeiro em uma situação financeira terrível, sem treinador, sem diretor e na beira da zona de rebaixamento. Entreguei o Cruzeiro em uma situação financeira difícil, porém campeão da Copa do Brasil no profissional e do Brasileiro no Sub-20, e com mais de 81%, em média, dos direitos econômicos dos jogadores da base. Na minha gestão o Cruzeiro vendeu mais de 60 milhões em jogadores da base. Infelizmente, o Cruzeiro ficou com uma fatia mais baixa desses jogadores, porque estavam muito fatiados.
Eu não tenho interesse de conversar com o Guilherme . Minha briga é com os chefes da organização. Os que estão abaixo na organização eu não tenho nada pra conversar. Ele vai ter que provar o que afirmou. Como pode uma pessoa afirmar que você aumentou a dívida do clube em 300% e te acusar de ter feito a contratação do Gonzalo Latorre, sendo que não fui eu que contratei?
Ele colocou na carta Sanchez Miño e Gino, que foram contratações que não deram certo, mas que também não geraram prejuízo financeiro para o Cruzeiro. Ao mesmo tempo, ele não fala das contratações que eu acertei.
Vou te dar o exemplo de um amigo meu. Você vai falar que o Alexandre Mattos foi um péssimo gestor por ter contratado o Rafael Donato? Ele também contratou Everton Ribeiro e Ricardo Goulart, e o que fica na história são os títulos conquistados por ele. Eu também conquistei títulos. Em cinco anos e meio no Cruzeiro, o clube conquistou dois Campeonatos Brasileiros Sub-20, dois do profissional, um Mineiro e uma Copa do Brasil. Vou ser lembrado pela Copa do Brasil, que é o título que eu estava lá. Se eu tivesse alguma coisa para temer, eu não estaria de peito aberto. Não aceito que falem da minha idoneidade. Errei na contratação do Sanchez Miño? Errei. Paguei muito pelo Ábila? Pagamos muito mesmo por ele, mas quanto custa cair para a Segunda Divisão? O cruzeirense não sabe.
Relação do Cruzeiro com o empresário Genivaldo dos Santos
O Genivaldo é um empresário que teve um contato direto com o Gilvan. Ele fazia as negociações, onde ele tratava diretamente com o Gilvan. No meu período no departamento profissional foram duas contratações com a participação do Genivaldo: Ezequiel e o Careca. Eu vejo isso com naturalidade. O Cruzeiro vive um sistema presidencialista. Então, no fim, o presidente pode contratar quem ele quiser. Ele confiava no scouting e contratou esses dois jogadores. Antes de eu chegar ao profissional, ele contratou também outros jogadores que ficaram na base mesmo sem ter idade, porque o Brasileiro Sub-20 permitia até dois jogadores fora da idade. Esses jogadores foram o Luiz Fernando, que está no Guarani, e o Caique Valdívia, do Criciúma. Acho que somente esses dois.
Quando eu saí da base do Cruzeiro, eram 144 atletas e 77 agentes e procuradores, sendo que 12 dos 144 atletas não tinham empresários. O Lucão, goleiro que está no profissional, por exemplo, só escolheu o empresário quando estava no sub-20. São decisões do atleta. Sinceramente, não sei falar quantos atletas cada procurador tem. Mas também não tem nada de errado o empresário ter um atleta ou 15 atletas. Na média, quando eu saí da base era 144 para 77, agora, na última vez que perguntei, tinha caído para 60 procuradores. Mas mesmo assim é um número baixo. No Rio de Janeiro, por exemplo, tem empresário com 30 atletas em uma base. Isso não tem no Cruzeiro. O máximo que chegou a ter foi por volta de 15 mesmo. Hoje, eu acho que não tem, mas não posso afirmar.
Amizade com o empresário Luiz Rocha
Eu tive relacionamento bom com 99% dos agentes. O único agente que tive um entrevero foi o Nick Arcuri, durante a renovação do Alisson. O Luiz Rocha, depois na negociação do Lucas Silva, partiu para uma captação muito forte da geração 2001. Depois ele foi perdendo durante o tempo. Atualmente, ele tem mais atletas no Palmeiras do que no Cruzeiro. Eu vejo isso com naturalidade. Depois da venda do Lucas, eu tive uma discussão muito forte com o Luiz Rocha por causa do goleiro Lucão. Ele pegou o atleta no Sub-20 e não queria que o jogador renovasse. Eu cheguei a rachar com o Luiz Rocha por causa disso. Foi uma das poucas discussões que eu tive. Atualmente, tenho uma relação muito boa com ele. É um agente como outro qualquer
Percentuais baixos do Cruzeiro sobre direitos de jogadores
Dos jogadores que contratei, o único com percentual baixo foi o Diogo Barbosa. Realmente nós contratamos o Diogo sem ter condições. Tinha uma disputa muito grande com o Flamengo - ele e o Caicedo foram contratados pelo Scuro, com o nosso aval. O Hudson e o Thiago Neves eu fiz. O único jogador com um percentual mais baixo foi o Diogo, que era um atleta que a gente achava que não poderia perder. Temos 100% do Thiago Neves, por exemplo.
Aumento das dívidas do Cruzeiro
Eu acho difícil ter aumentado em 300% a dívida na minha gestão. Posso afirmar que é uma acusação totalmente leviana e absurda. Aumentar 300% em dois anos chega a ser ridículo. Ele vai ter que provar. Todo mundo que acusa tem que provar.
Rescisão com Paulo Bento
O Paulo Bento tinha um contrato europeu. Esse pode ter sido um dos nossos erros, mas na época a gente estava muito pressionado. No contrato tinha que, caso ele fosse demitido, ele receberia o contrato até o final. Logo depois que foi demitido, ele arrumou um emprego no Olympiacos da Grécia. Aí o agente dele ligou para o Cruzeiro e falou: "O Paulo vai para o Olympiacos, porém os salários na Grécia são muito mais baixos do que no Brasil, então ele só vai se o Cruzeiro pagar 50% dos salários dele". Nós não aceitamos e falamos que poderíamos continuar pagando 100% do salário. Na verdade, foi até o Gilvan quem participou dessa negociação, nem fui eu. Ele falou que ficaria parado durante esse tempo, aí veio a discussão comercial e acabamos fechando para pagar 30% do salário dele. Então, é aquela questão de ver o copo meio cheio ou meio vazio. Dá pra ver que o Cruzeiro teve 70% de economia ou 30% de prejuízo. Na verdade, foi bom ele ter ido para o Olympiacos. Inclusive, depois ele nem cumpriu o contrato lá. Então, se não tivéssemos feito esse acordo, estaríamos pagando 100% do salário dele até hoje. Vicintin disse que não quer voltar ao futebol - Foto: Ramon Lisboa/EM/D. A Press
Folha salarial do Cruzeiro
Vamos pensar que seja R$ 11 milhões a folha salarial, mas não é R$ 11 milhões. Daria cerca de R$ 130 milhões por ano. Não é isso, mas vamos dizer que é. O Cruzeiro fatura entre R$ 230 e R$ 250 milhões, então, eu acho que o Cruzeiro teria condições de pagar. O problema do Cruzeiro, na minha opinião, não é o futebol. O Cruzeiro tem um overhead muito grande. Na minha opinião, o Cruzeiro não precisa de uma sede administrativa tão cheia. Se eu fosse presidente do Cruzeiro, eu tentaria enxugar essas questões fora do futebol. Mas eu não tenho esse arrependimento. A folha do Cruzeiro é controlável. O clube passa por uma dificuldade financeira em função da gestão financeira e por uma série de motivos. Os problemas vão se acavalando e chega no final mais complicado.
A minha preocupação, hoje, é que o Cruzeiro continua sem dinheiro, porém o Cruzeiro tem muitos ativos. Esses ativos, se forem bem manejados, devem melhorar a situação financeira do clube. Qual é o grande risco financeiro que o Cruzeiro corre, na minha opinião? É continuar sem dinheiro e delapidar os ativos. Não pode deixar de ter 81% dos jogadores da base. Se isso acontecer, a situação do Cruzeiro fica realmente muito difícil.
Dívidas relativas a contratações
Na verdade, a gente tinha como pagar quando os jogadores foram comprados. O problema é que o dinheiro foi usado para outras coisas, aí não tinha como pagar. Para mim é muito delicado discutir uma gestão financeira que eu não fiz parte. Eu não era diretor financeiro e nem participava da gestão financeira. Pode ser uma coisa equivocada? Eu acho que o vice-presidente deveria ter mais ligação com o financeiro, mas não é a forma como o Cruzeiro trabalha. O Cruzeiro funcionava em ilhas separadas. O futebol contratava, o presidente autorizava e a gente presumia que o financeiro tinha condições de arcar. Nada foi feito pensando que não teria como pagar.
Tanto o Sobis quanto o Ábila foram comprados com a cota de renovação com a televisão, e depois tinham outras parcelas que programamos fazer depois. Mas o dinheiro foi usado para arcar com outros compromissos que o Cruzeiro tinha.
Saída do Cruzeiro
Na verdade, eu tinha decidido sair por questões pessoais.Eu já achava que eu tinha que estar mais perto da minha família e dos meus negócios. Porém, eu amo muito o clube e fica aquela dúvida sobre sair ou não. Eu liguei para o Wagner e para o Gilvan e convoquei uma reunião para dois dias depois da eleição. Eu perguntei como ficaria o futebol. O Wagner já tinha me convidado para ser o vice-presidente de futebol, mas com o Itair sendo gestor de futebol, abaixo de mim. Eu falei que estava satisfeito com minha equipe, que tinha Klauss Câmara, Tinga e outras pessoas, e que eu não tinha interesse em trabalhar dessa forma e nem com o Itair Machado. Eu disse a ele que se fosse assim, eu ia querer sair.
O Wagner falou comigo que o Itair estava viajando para os Estados Unidos, que a gente ia se dar muito bem, e pediu que eu esperasse ele chegar para a gente conversar. Quando o Wagner saiu da reunião eu comuniquei ao Gilvan que não ia ficar, que eu já tinha tomado essa decisão. É bom deixar bem claro que o Wagner tem todo o direito de trabalhar com quem ele quiser, assim como eu tenho o direito de escolher com quem eu trabalho.
Aí eu falei com o Gilvan que eu não ia ficar, e ele me pediu calma. Eu fui para casa, pensei bastante e fiquei sabendo que o Itair não estava nos Estados Unidos - o Wagner se enganou ou faltou com a verdade na reunião. Falei com o Gilvan que as coisas não estavam caminhando bem, escrevi a carta, liguei para o Gilvan e para o Lemos, que me colocaram no Cruzeiro, liguei para o Tinga e para o Klauss, e publiquei a carta.
A princípio, a minha decisão de sair era familiar e profissional, mas depois o que pesou foi que eu queria escolher as pessoas para trabalhar.
Relação com Wagner Pires de Sá
Quando o Wagner se candidatou, ele me ligou pedindo pra eu ser o vice de futebol. Hora nenhuma eu confirmei que seria, agradeci o convite e disse que conversaríamos depois. É normal ele querer trabalhar com a equipe dele, e eu escolhi não trabalhar com as pessoas escolhidas por ele. Que tenham sorte. O meu amor maior é o Cruzeiro, e quero que o Cruzeiro continue vencendo.
Retorno ao Cruzeiro e apoio a Pedro Lourenço (Supermercados BH)
Eu acho muito difícil que eu seja candidato. Muito difícil mesmo. Claro que no futebol tudo muda, mas, hoje, o meu candidato é o Pedrinho , já falei isso com ele. Acho que ele será um grande presidente do Cruzeiro. Ele até brincou que caso ele seja presidente, eu seria o vice-presidente de futebol e o Alexandre Mattos seria o diretor. Tudo em tom de brincadeira. Ele me perguntou se eu aceitaria, e eu disse a ele que estou muito desgastado com o futebol, porém, ele teria, a partir dali, o meu apoio. O Cruzeiro não teria sido pentacampeão sem o Pedrinho. Ele é um cruzeirense fenomenal, e que merece o apoio de todos. Caso ele seja candidato, ele terá o meu apoio. O futuro a Deus pertence, mas, hoje, eu não tenho interesse de voltar. Eu tenho 40 anos. três filhos para criar, uma empresa... Tive problemas de saúde do meu pai, que com o futebol se tornaram públicos também. Então, eu tenho o interesse de me afastar do futebol. A princípio não tenho o interesse de continuar no Cruzeiro.
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