Em 2013, Flamengo entregou faixas para o campeão Cruzeiro no Maracanã na última rodada do Brasileiro - Foto: Roberto Filho/Fotoarena/Folhapress RIO DE JANEIRO-RJ
Às vésperas do primeiro jogo entre Cruzeiro e Flamengo, pela final da Copa do Brasil, os clubes têm dado demonstrações mútuas de respeito nas redes sociais. Essa proximidade é reflexo de um bom relacionamento não só entre as diretorias, mas entre as torcidas organizadas celestes e rubro-negras desde os anos 1980. A parceria entre elas surgiu em um cenário de rivalidade entre Atlético e Flamengo naquela década, e foi potencializada pelo crescimento desses grupos de torcedores no Brasil.Na década de 1980, Atlético e Flamengo protagonizaram jogos decisivos. Em 1980 e 1987, os cariocas eliminaram os mineiros no Campeonato Brasileiro. Em 1981, por sua vez, o Rubro-negro tirou o rival cruzeirense da Libertadores, com arbitragem polêmica de José Roberto Wright.

Esses duelos em competições importantes fizeram com que as torcidas de Atlético e Vasco, rival histórico do Flamengo, se aproximassem. Como consequência, cruzeirenses e flamenguistas se tornaram aliados fora das quatro linhas.

Além do aspecto esportivo, a ligação entre torcidas de diferentes clubes começou a ser estabelecida no país para facilitar a logística em viagens para acompanhar jogos. A organizada que deixava sua cidade de origem encontrava apoio no destino justamente com suas facções aliadas. Além de hospedagem, churrascos são compartilhados Brasil afora.

Éder Toscanini, de 56 anos, conhecido no meio das torcidas como Tosca, foi um dos fundadores da Máfia Azul Cru-Fiel Floresta, em 1977. Ele explicou como se iniciou a relação entre as organizadas de Cruzeiro e Flamengo.

"Isso aconteceu muito em função das partidas contra o Atlético . Nossa torcida recepcionava a torcida do Flamengo aqui em Belo Horizonte. A primeira torcida organizada deles que a Máfia Azul se tornou parceira foi a Raça Rubro-Negra e, posteriormente, a Torcida Jovem Fla. A Jovem foi com quem começamos a aliança do Punho Cruzado, que também envolve a Torcida Independente, do São Paulo, a qual ainda somos muito amigos", disse ao Superesportes.

Nos anos 1990, as organizadas se tornaram empresas e ganharam mais projeção, inclusive dentro dos clubes. Foi nessa década, também, que as torcidas de Cruzeiro e Flamengo se aproximaram de vez. No confronto entre as duas equipes, no Mineirão, pelo Campeonato Brasileiro de 1995, os cruzeirenses homenagearam os flamenguistas pelo 100º aniversário do clube carioca.

"Nós recebemos as torcidas do Flamengo aqui em BH e fizemos uma festa bacana. Durante o jogo eu puxei o parabéns na torcida do Cruzeiro em função do centenário deles. Nos aproximamos ainda mais", lembra Tosca.

No duelo pelo turno do Brasileiro deste ano, torcidas dividiram espaço das faixas no Mineirão - Foto: EM/D. A Press
Embora em campo os clubes travem disputas acirradas, como na final da Copa do Brasil de 2003, vencida pelo Cruzeiro, a relação entre as torcidas perdura até hoje. Gilson Nascimento, colaborador da torcida Fla Manguaça, explicou como é a parceria, por exemplo, com a Cachazeiros, torcida organizada celeste.

"A relação da torcida do Flamengo com a do Cruzeiro é a melhor possível. No jogo do Brasileiro deste ano eu andei uniformizado no entorno do Mineirão, no meio dos torcedores do Cruzeiro, e não tive nenhum tipo de problema. A torcida Cachazeiros, por exemplo, sempre recebe a Fla Manguaça com churrasco, e nós sempre recepcionamos eles na nossa sede aqui no Rio", explicou à reportagem.

Em jogos em BH e no Rio, é comum ver torcedores de Cruzeiro e Flamengo ocupando mesmo espaço - Foto: Rodrigo Clemente/EM/D.A Press
Ação de marketing inédita entre finalistas

No dia 25 de agosto deste ano, logo após o sorteio que definiu os mandos de campo das finais, Flamengo e Cruzeiro iniciaram um troca de mensagens no Twitter ratificando a histórica relação de respeito entre suas torcidas. Imediatamente, as postagens viralizaram e ganharam apoio. "Final dos Parças" e "Final de Time Grande" foram alguns termos utilizados pelos próprios adeptos.

Dias depois, as duas instituições criaram uma ação de marketing conjunta utilizando a hashtag "FinalDeTimeGrande". Já nessa segunda-feira, uma outra campanha, com o termo "Resenha de Time Grande", passou a estimular que torcedores recebam os adversários em clima de paz no Rio de Janeiro, nesta quinta, dia 7, e em Belo Horizonte, na finalíssima do dia 27.

Linha do tempo da relação entre as torcidas organizadas de Cruzeiro e Flamengo:

1967 - Criação da torcida organizada Jovem Fla, do Flamengo

1977 - Fundação das torcidas organizadas Máfia Azul, do Cruzeiro, e Raça Rubro-Negra, do Flamengo

1978 - Goleiro Raul Plassmann deixa o Cruzeiro após 13 anos para jogar no Flamengo. Seria ídolo histórico dos dois.

1980 - Flamengo derrota o Atlético na final do Campeonato Brasileiro.

1981 - Flamengo elimina o Atlético na primeira fase da Libertadores, em jogo com arbitragem polêmica de José Roberto Wright.

1987 - Flamengo supera o Atlético nas semifinais do Campeonato Brasileiro.

Anos 1990 - Consolidação das organizadas e criação de alianças entre facções de todo o Brasil. Torcidas do Cruzeiro estabelecem parcerias com organizações de Flamengo, São Paulo, Internacional, Atlético-PR e Sport, por exemplo.

1995 - Homenagem da Máfia Azul ao centenário do Flamengo. 

Desde então, torcidas se tornaram parceiras e prezam pela paz em jogos no Rio e em BH.

* Estagiários sob supervisão do editor Bruno Furtado