O técnico Paulo Bento, de 46 anos, deixou boa impressão em sua entrevista de apresentação ao Cruzeiro, nesta segunda-feira à tarde, na Toca da Raposa IIEm bom português, o lisboeta mostrou ter muitas convicções, mas disse estar totalmente aberto para entender a cultura do futebol brasileiro e se adaptar a ela“Não posso querer que todos se adaptem à minha forma de pensarDevo ser respeitoso com a cultura do clube, do futebol brasileiro, mas pensando sempre em melhorar os jogadores coletivamente”, destacou.
Disciplinador, simCarrasco, jamaisPaulo Bento esclareceu que a fama que carrega em Portugal se deve ao profissionalismoPorém, garantiu ser flexível e um bom líder“A partir de amanhã, quando os jogadores nos virem trabalhar, eles vão identificar, vão ver uma boa organização, vão se sentir confortáveis nessa organização, verão pessoas disponíveis para ajudá-los em todo o momento no profissional e no pessoal, se for da vontade delesEstaremos 100% disponíveis para trabalhar em prol do clube, e eles ficarão satisfeitos, alegres”.
Em longa entrevista, o novo comandante ainda analisou o elenco e o time do Cruzeiro, falou da perspectiva de trazer reforços e da filosofia que pretende implementarLeia, a seguir, a íntegra do que disse Paulo Bento.
Chegada ao Cruzeiro
Antes de responder a primeira pergunta queria agradecer ao clube e à direção pela oportunidade de ter a minha primeira experiência de trabalhar fora do país (Portugal)E logo num clube de grande dimensão, um dos maiores do Brasil
Expectativa pelo trabalho
A expectativa é tentar fazer um bom trabalho para que a equipe evolua da melhor maneiraSe pudermos ajudar para o futebol brasileiro evoluir da melhor maneira, ficaremos satisfeitos e motivados por issoQueremos construir uma equipe competitiva que possa lutar num campeonato extremamente difícil de disputar.
Elenco do Cruzeiro
Quando aceitamos esse desafio e, a partir do momento que tivemos o primeiro contato, tivemos a oportunidade de tentar identificar o mais rápido possível a equipe do Cruzeiro, a composição da equipe, e vir o mais preparado possívelEstamos numa fase em que o Campeonato Brasileiro acabou de começarClaro, com a disputa anterior do EstadualSerá um trabalho difícil, pois entraremos no campeonato a disputarMas é um desafio motivador, do qual estamos integrados dentro daquilo que o clube pretende.
O que fez nos últimos dois anos (sem clube)
Normalmente creio que todos os treinadores passam por uma situação de ficar sem trabalhoNesse período, eles tentam melhorar seus conhecimentos, tentam descobrir a melhor forma para evoluir enquanto treinador e se atualizarFoi isso que fiz durante esse períodoNão trabalhei porque não deveria fazer parte de algumas situações
Adaptação dos brasileiros à filosofia europeia
Não creio que isso seja uma realidade absurdaTive a oportunidade de treinar jogadores brasileiros em PortugalOs jogadores brasileiros tiveram rendimento extremamente louvávelNão creio que isso seja improvávelAquilo que pretendemos fazer é trazer algumas ideias que façam a equipe jogar de uma certa formaAo mesmo tempo, temos que nos adaptar àquilo que são as características dos jogadores brasileirosOs brasileiros jamais perderão a capacidade técnica que têmO que temos que fazer é aproveitar essa boa capacidade técnica numa boa organização tática.
Time do Cruzeiro
Já tenho um bom conhecimento da equipeNaturalmente, como disse, tenho que me adaptar àquilo que a equipe já temE tentar alterar algumas coisas em benefício do clubeA equipe vem jogando no 4-2-3-1 ou 4-3-3Então vamos conversar com os jogadores e tentar fazer com que eles assimilem da maneira mais rápida as nossas ideiasJá temos um jogo no sábado, às 21hÉ chegar da melhor maneira a esse jogo e conquistar os três primeiros pontos no campeonato.
Elenco muito jovem: média de 24 anos
O Cruzeiro já é conhecido por essa filosofia de revelar jovensÉ verdade que é um plantel com quantidade alta de jogadores jovensMas talento e qualidade não têm idadeAgora, outras coisas ajudam, como maturidade, tranquilidadeEntão, dentro daquilo que existe na equipe do Cruzeiro, é tentar tirar o que têm de melhor, independentemente de jogadores mais velhos ou mais jovensMas entendendo que é necessária alguma tolerância, paciência com alguns jogadores, por conta da idade que têm.
Idioma pode facilitar adaptação
Creio que poderá facilitar (a língua), a transmissão das ideias, da mensagemNão perderemos tempo com a questão do idiomaIsso pode facilitar o trabalho, mas nós só da comissão, mas dos jogadores, o que é essencial.
Calendário brasileiro mais apertado
Sobre o calendário, não diria que tem muitos jogos, tem 38 rodadas, mas a Espanha também tem, Inglaterra, FrançaMas a grande questão é que lá são 38 rodadas em dez meses e aqui em sete mesesEssa é a diferençaAcumulados a isso os jogos da Copa do Brasil, que são disputados em ida e voltaTêm ainda os Estaduais, com qualidade de jogos elevada no início do ano, e pode atrapalhar a preparaçãoMas isso vai nos deixar melhores, vai nos obrigar a treinar de outra maneira, a pensar a estratégia dos jogos de outra maneiraDeveremos saber o que fazer em cada momentoExistem viagens, intervalos diferentes entre os jogos, e isso vai nos deixar mais ativos, mais concentradosEste é um desafio motivante.
Necessidade de rodízio de jogadores em jogos
O calendário obriga um bocadinho a ter essa ideia (rodízio), a rotatividade A própria quantidade de jogos em pouco espaço de tempo obriga algumas alteraçõesMudar uma quantidade elevada de jogadores pode não ser benéficoDevemos envolver todos os jogadores no processo de treino, que todos saibam o que fazer em cada momento do jogo, e que o treino seja a melhor mensagem sobre a nossa maneira de jogarMas a verdade é que, em alguns momentos da temporada, teremos que mudar, é algo obrigatório da nossa parte
Primeiro contato com o elenco
Foi uma análise da parte técnica, tática, daquilo que vimosEsses dias têm sido de recolha de informação, e aqui quero deixar agradecimento à estrutura do clube, pela contribuição que nos tem dado para iniciar amanhã nossas ações de treino da melhor maneira possívelA partir daqui é que vamos começar a conhecer melhor os jogadores, pelo contato, pelos treinos, porque passaremos a interagir com elesO conhecimento agora será mais abrangente.
Estilo disciplinador
A disciplina, há duas formas de se relacionar com disciplinaUma: ou é como eu quero ou não éE isso é usar disciplina de forma negativaOutra é usar a disciplina como forma positiva e tem a ver com algo que deve existir em todas as atividades, ser rigoroso com o que fazemos, disciplinados e respeitosos uns com os outros e ser respeitoso com os clubes que representamosEu sou treinador há 12 anos, desde 2004, e nunca faltei ao respeito com algum jogadorNunca insultei algum jogadorMas creio que, numa organização, que tem que haver disciplina e rigor, isso sim.
Após outra indagação sobre o estilo disciplinador...
Eu creio que, de alguma forma, tinha respondido a um colega seuVejo disciplina como situação positivaTenho uma coisa que, pra mim, é clara, é transparenteA partir de amanhã, quando os jogadores nos virem trabalhar, eles vão identificar, vão ver uma boa organização, vão se sentir confortáveis nessa organização, verão pessoas disponíveis para ajudá-los em todo o momento no profissional e no pessoal, se for da vontade delesEstaremos 100% disponíveis para trabalhar em prol do clube, e eles ficarão satisfeitos, alegresE quando acabar cada seção (de treino), verão que cada ação tem um objetivoPedirei 100% todos os dias, pois vivemos disso, não fazemos outra coisaQuem não dá tudo, não dá nada, é como dizemos no meu país.
Reforços
Vamos com tempo, com calmaEm função também da própria competição, do calendário do futebol brasileiro, normalmente as equipes têm muitos jogadoresO Cruzeiro tem grande vantagem que é ter na base bons jogadores que podem chegar à equipe principalMas, em conjunto com diretores, tentaremos analisar dentro do que vimos, do que veremos essa semanaDepois disso, tomar as melhores decisõesMas, antes disso, temos que dialogarNo momento oportuno, falaremos com o clube e faremos o que for mais conveniente.
Diferença de ser jogador e treinador
Ser jogador e treinador é muito diferenteDesfrutei das duas coisasComo jogador, foram 15 anosMas o grau de dificuldade e complexidade não é comparávelSó temos essa noção quando passamos para o outro lado (de técnico)Enquanto treinadores, temos que ser fiéis às nossas ideias, mas nos adaptarmos às nossas realidadesTenho que me adaptar agora, não posso querer que todos se adaptem à minha forma de pensar, mas devo ser respeitoso com a cultura do clube, do futebol brasileiro, mas pensando sempre em melhorar os jogadores coletivamente.
Imediatismo e falta de paciência de torcidas brasileiras com técnicos
NãoQueremos muito também (dar certo), e que eles se sintam orgulhosos, felizes da forma que queremos jogar e dos resultados que queremos alcançarÉ natural num clube dessa grandeza que haja pressão grande, mas não é algo novo pra mimO Sporting é um dos grandes clubes do meu país, a seleção nacional tem uma pressão tremenda, em contexto diferente, e isso é algo que devemos viver naturalmenteDevemos assumir que a pressão existe, e que isso não tolha nossas ideias, e que passemos aos jogadores o que é fundamentalIsso (pressão) tem que ser fator de motivação, algo que nos faça melhorar, que nos deixe mais concentrados, mais alertas para cuidar de todos os detalhes que teremos que cuidarA pressão faz parte do futebol e viver sem ela não é agradável.
Contribuição que pode dar ao Brasil (após 7 a 1 na Copa, por exemplo)
Eu creio que as decisões podem ser tomadas em qualquer momentoNão é preciso acontecer algo negativo (7 a 1, por exemplo), para tomar uma decisãoNesta atividade, devemos estar em permanente evolução, é isso que se trataAquilo que o futebol brasileiro pretende é isso tambémNão quero acreditar que seja exclusivamente os cursos que se faz na Europa, que te transformam em treinadorAjuda, sem dúvidaMas não que isso nos faça treinador, não mesmoTemos objetivo de contribuir para que o futebol brasileiro possa melhorar, mas não viemos inventar a pólvoraO Brasil é país com cinco Copas, tem equipes que ganharam a Libertadores, como o Cruzeiro, tem um campeonato competitivo, disputado, com sua própria culturaTentaremos criar coisas novas, mas aprenderemosÉ o dar e receber, estamos sempre a aprender.
Esquema tático preferido
Eu já tive oportunidade nesses anos (12 de carreira), de treinar no Sporting em um esquema, e na Seleção Portuguesa jogávamos de outra maneiraMais que o esquema, o que será determinante será o conhecimento que transmitiremos aos jogadores, nossas ideiasO esquema é de onde se parte, mas depois têm dinâmicas próprias e os jogadores terão que assimilarQuando tiver a bola, quando não tiverCaberá interpretar da melhor maneira cada situação.
O que sabe de reforços que chegaram e ainda não jogaram (Robinho e Bryan)
A questão do que está feito no clube, foi feito com perspectiva de melhorar a equipe, o plantel, e o que vamos tentar fazer agora junto da diretoria é avaliar da melhor maneira o que é a equipe agoraDepois, se entendermos que é necessário tomar decisões, tomaremosA partir de amanhã, começaremos a trabalhar da nossa forma, dotar os jogadores do melhor compromisso possível, e assimilar as nossas ideias.
O que pode ser aproveitado da Europa no Brasil
A grande característica do futebol brasileiro é a relação com a bola, e a grande qualidade técnica que temMas para se ganhar jogos, e está mais difícil fazê-lo, temos que juntar à técnica uma organização, aquilo que a equipe deve fazer em cada momento do jogo, a atitude com que jogaPoderá jogar com estratégias diferentes, mas o compromisso e a atitude não devem ser negociadas.
Contribuição ao Cruzeiro
Se há ideias, conceitos diferentes, é natural transmitir a alguns e receber de alguns tambémTemos de tomar as decisões e encaixar da melhor maneira, tornar a equipe melhor.
Campeonato Brasileiro
Sobre o Campeonato Brasileiro, também já me referiÉ campeonato competitivo, é um campeonato extremamente equilibradoNos últimos anos, o Cruzeiro o conquistou duas vezesIsso não é algo que se faça regularmenteOs campeões têm mudado com frequência também pelo que tenho vistoMas é campeonato com muita qualidade técnicaSe joga diferente do que se joga na Europa, com características próprias, com momentos de transição maiores, com perdas de bola mais frequentes, permitindo contra-atacar com frequênciaDevemos encontrar uma forma de jogar, e encontrar estratégias de deixar o adversário em situação difícilQue o nosso jogo seja inconveniente para nossos rivais.
Estrutura da Toca da Raposa II
Em comparação ao Sporting, é algo parecido na dimensão, na qualidade de campos para treinar, o edifício com algumas coisas similaresEm relação à seleção, é impossível comparar porque no tempo em que estive lá, a seleção não tinha espaço próprio onde ficar, andava a treinar e a fazer sua concentração em vários lugares.