"O Atlético não me tornou só um atleta, mas sim um homem. Devo muito aos que passaram por mim, psicólogas, pessoas que nos ajudavam na escola, no clube, o estafe. Gratidão é a palavra certa para definir o que eu sinto pelo Atlético", declarou Matheus Mendes, de 22 anos, uma década depois de não desistir do futebol, em entrevista ao Superesportes.
O início no Filadélfia, clube da cidade onde nasceu, era promissor. No futsal, destacava-se pela força e altura. Passou para o campo e chamou a atenção do Santos em uma 'peneira' realizada em Valadares. Foi aprovado, mas não ficou no litoral paulista, já que a mudança não seria possível por conta do trabalho do pai. Mas engana-se quem pensa que aquele foi uma barreira no sonho do garoto. Pelo contrário: ali começou uma nova história.
"Foi aí que o pessoal entrou em contato com o Atlético e conseguiu o aval para eu fazer um teste. Fiz uma semana de testes e passei. Estamos na luta há nove anos, serão dez neste próximo ano", sorri, ao lembrar dos tempos de infância e pré-adolescência no clube. " Vim para cá com meus 12 para 13 anos e fiquei na casa de pessoas conhecidas. Veio um outro menino de Valadares também e fiquei na casa dos avós dele", conta.
"Era perto do CT, mas eu tinha que pegar ônibus para ir para a escola. Esse ônibus parava no ponto atrás do CT, eu descia para treinar à tarde e voltava só à noite para casa. Então, eu saía às 6h, 7h para a escola e chegava só 18h, 19h em casa. Foi uma experiência e tanto. Minha mãe e o meu pai, que me deixaram sair de casa tão novo, devem ter ficado com o coração apertado, porque eles não vieram", relembra o goleiro.
Trajetória no Atlético
Matheus ficou entre 2012 e 2019 na base alvinegra. No período, começou a chamar a atenção da diretoria atleticana e da Seleção Brasileira - foi convocado em 2018 para atuar pelo time Sub-20. Em 2020, finalmente conseguiu a chance que tanto perseguia no profissional. Mas não foi pelo Atlético.
Sem espaço na Cidade do Galo, o garoto foi emprestado ao CSA para a disputa da Série B do Campeonato Brasileiro de 2020. Destacou-se pelo clube alagoano, que bateu na trave na briga pelo acesso. "No CSA, eu pude mostrar um pouco. Foi muito bom poder ter saído, já que nunca tinha jogado profissionalmente", conta o goleiro, que fez 28 jogos e levou 23 gols (boa média de 0,82 por partida).
O bom desempenho na Segunda Divisão fez o Atlético reintegrá-lo ao elenco em 2021. Mais que isso: o clube renovou o contrato dele até o fim de 2024. Nesse processo, um ídolo de Matheus foi fundamental. "O Victor, sem sombra de dúvidas (é uma inspiração). Este ano, ele me ajudou bastante na minha renovação. Não só na renovação, mas também no dia a dia, quando ele ainda estava jogando, antes de se aposentar", disse, antes de citar outros dois como espelhos. "Eu gosto bastante dos goleiros brasileiros, o Alisson e o Ederson para mim são grandes nomes e inspirações que a gente pode acompanhar e seguir".
Estreia e futuro
O retorno ao Atlético teve início triunfal. Terceiro goleiro, Matheus estreou pelo profissional ao substituir o lesionado Rafael durante a vitória por 1 a 0 sobre o Athletic, em 24 de abril, pelo Campeonato Mineiro. Poucos dias depois, entrou no lugar do expulso Everson e defendeu um pênalti na vitória por 3 a 0 diante do Tombense, na partida de ida da semifinal do Estadual. Na volta, jogou os 90 minutos no empate por 1 a 1.
"Poder estrear foi uma coisa incrível. Não imaginava que na semana seguinte à que eu estreei eu entraria e poderia defender um pênalti. Mas motra um pouco do que nós, goleiros, passamos. A gente tem que estar sempre preparado para o que vier, porque uma bola que vem pode ser crucial em relação a vitória ou derrota", conta.
Daí em diante, Matheus não jogou mais. Apesar disso, entende que a temporada foi boa - especialmente pelo desempenho coletivo do time, campeão mineiro, brasileiro e da Copa do Brasil. "Apesar de eu não ter jogado a quantidade de jogos que eu queria, foi uma temporada mais vitoriosa impossível. É uma honra poder participar de um grupo como este", diz.
"O Everson (titular) está no melhor ano da vida dele, o melhor goleiro nas competições que disputou, Seleção Brasileira... O Rafa (primeiro reserva) 'cheira a título', o pessoal brinca, e é um grande goleiro também. Todo mundo tem confiança nele. Cada um tem o seu momento. Eu tive o meu momento com a lesão do Rafa, que infelizmente aconteceu. Quando eu entrei, pude mostrar um pouco o meu trabalho, pegando aquele pênalti, jogando alguns jogos. Eu tenho gratidão total pelo ano. O ano foi maravilhoso para todos nós. Não tenho nada a reclamar", prossegue.
Mas o que 2022 reserva a Matheus Mendes? Buscar espaço no Atlético ou sair para ter mais oportunidades em outro clube? O goleiro garante: não tem propostas para sair e pretende ficar na Cidade do Galo. "O plano, até então, é continuar no Atlético. Não chegou nada de empréstimo, venda e nada. Qualquer coisa que chegar, a gente vai conversar, meu estafe vai conversar com o Atlético. Mas até então estou feliz no Galo, pretendo ficar e fazer parte do grupo no ano vem", assegura.
Superesportes: Como foi sua infância em Governador Valadares? O que você gostava de fazer além de jogar bola?
Matheus Mendes: "Nasci em Governador Valadares. Comecei estudando. Depois, fui para o Filadélfia, que é um clube da cidade. Comecei jogando futsal e, por curiosidade, comecei jogando na linha. Eu era atacante e acabei passando para o gol. Essa transição da linha para o gol foi depois de uma conversa que tive com a minha mãe. Eu não queria mais jogar bola, e ela falou: 'Continua, passa para o gol. Vou pedir para os meninos - que eram o Fabrício, o Bruno e o Nelsinho, os treinadores da época - te treinarem no gol'. Eu falei: 'Então vamos'.
Passei para o gol e acabei me destacando também. No futsal, tem aquelas jogadinhas de lateral, que rolam para o lado e o goleiro chega batendo. Eu me destacava muito nisso por conta da altura, da força, e sempre jogava na categoria acima. Desde novo, sempre gostei muito de futebol. Passei para o campo com meus 10 anos.
Dos 12 para 13, teve uma 'peneira' do Santos em Valadares. Eu passei e fui convidado a ir para Santos, passei (no período de treinos em Santos), porém pela logística com meu pai e minha mãe não seria possível naquele momento. Meu pai tem uma empresa em Valadares e não conseguiria mudar tudo para me acompanhar. Foi aí que o pessoal entrou em contato com o Atlético e conseguiu o aval para eu fazer o teste aqui. Fiz uma semana de testes e passei. Estamos na luta há nove anos, serão dez neste próximo ano".
SE: Como foi essa conversa com sua mãe para que você não desistisse?
MM: "Essa vontade de parar de jogar foi mais por querer passar para o gol. Na época, eu gostava muito do Rogério Ceni. Tinha até um banner do lado de dentro do meu armário. Eu queria sair da linha e ir para o gol. Minha mãe conversou com o pessoal e eles começaram a me treinar no gol. Continuei por isso. Quis desistir não foi por não gostar de futebol, nem nada, foi mais por conta da transição e porque naquela idade, mais novo, não tem um trabalho específico para goleiro. Minha mãe, na época, me deu forças e falou: 'Continua, é disso que você gosta'. Aqueles conselhos de mãe... Hoje, graças a Deus, está dando tudo certo."
SE: Você, quando criança, pensou em ser outra coisa ou sempre quis ser jogador de futebol?
MM: "Sempre esteve na minha cabeça que eu queria ser jogador de futebol. Sempre. Esse era um pensamento meu desde novo. A questão de querer parar mesmo foi por essa transição da linha para o gol por gostar do Rogério Ceni e de gostar de jogar no gol".
SE: Você mencionou o Ceni. Quem são seus ídolos no gol?
MM: "Como falei, o Rogério, no início. O Victor, sem sombra de dúvidas. Este ano, ele me ajudou bastante na minha renovação. Não só na renovação, mas também no dia a dia, quando ele ainda estava jogando, antes de se aposentar. Eu gosto bastante dos goleiros brasileiros, o Alisson e o Ederson para mim são grandes nomes e inspirações que a gente pode acompanhar e seguir".
SE: Como foi a mudança para Belo Horizonte? Sua família foi junto ou ficou em Valadares?
MM: "Eu vim para cá com meus 12 para 13 anos e fiquei na casa de pessoas conhecidas. Veio um outro menino de Valadares também, que hoje não está mais com a gente e estuda lá em Valadares. Eu fiquei na casa dos avós dele. Era perto do CT, em Vespasiano mesmo, mas eu tinha que pegar ônibus para ir para a escola. Esse ônibus da escola parava no ponto atrás do CT, eu descia para treinar à tarde e voltava só à noite para casa. Então, eu saía às 6h, 7h para a escola e chegava só 18h, 19h em casa.
Para mim, foi uma experiência e tanto. Hoje, posso contar isso. Mas acho que a minha mãe e o meu pai, que me deixaram sair de casa tão novo, devem ter ficado com o coração apertado, porque eles não vieram e a gente ficou longe. A gente tinha contato, na época tinha celular, mas não tinha Whatsapp, era mais ligação. Mas graças a Deus deu tudo certo. É essencial para nós quando saímos de casa - não só jogador de futebol, mas todo mundo que tem essa vontade de ser alguma coisa na vida - ter desde cedo essa força de vontade".
SE: Você está indo para o seu décimo ano de Atlético, quase o mesmo tempo do que você tinha de vida antes de chegar ao clube. O que o Galo significa para você?
MM: "Eu tenho uma gratidão enorme pelo Atlético. Acho que o Atlético não me tornou só um atleta, um jogador de futebol, mas sim uma pessoa também, um homem. Devo muito a eles, a pessoas que passaram por mim, psicólogas, pessoas que nos ajudavam na escola, no clube mesmo com reuniões, o pessoal todo do estafe do Atlético. Como vim novo, devo muito a eles. Gratidão é a palavra certa para definir o que eu sinto pelo Atlético".
SE: Qual o papel dos psicólogos para vocês, tão novos e tão longe de casa, no processo de amadurecimento?
MM: "Dão esse auxílio. Como a gente sai de casa muito novo e não tem a mãe e o pai por perto, acho que essas pessoas suprem nossas necessidades. Estão ali até para dar a atenção que a gente precisa. Se você não está num dia tão legal e precisa conversar e também para poder passar um respaldo aos pais, que estão de longe acompanhando, mas não sabem o que está acontecendo na verdade".
SE: Você teve destaque no CSA em 2020 e, em 2021, jogou só três vezes no retorno ao Atlético, que conta com Everson e Rafael para a posição. Como foi a temporada pessoalmente?
MM: "Apesar de eu não ter jogado a quantidade de jogos que eu queria, foi uma temporada mais vitoriosa impossível. Em todos esses anos, foi a melhor temporada do Atlético. É uma honra poder participar de um grupo como este. A gente não tem nem o que discutir em relação a goleiro. O Everson está no melhor ano da vida dele, o melhor goleiro nas competições que disputou, Seleção Brasileira... O Rafa 'cheira a título', o pessoal brinca, e é um grande goleiro também. Todo mundo tem confiança nele.
Cada um tem o seu momento. Eu tive o meu momento com a lesão do Rafa, que infelizmente aconteceu. Quando eu entrei, pude mostrar um pouco o meu trabalho, pegando aquele pênalti (contra o Tombense), jogando alguns jogos. Eu tenho gratidão total pelo ano. O ano foi maravilhoso para todos nós. Não tenho nada a reclamar".
SE: Como é o dia a dia e a relação de vocês três (Rafael, Everson e Matheus) e os preparadores Rogério Maia e Danilo Minutti?
MM: "Apesar de só um jogar, o grupo dos goleiros é muito unido. A gente tem um grupo no Whatsapp em que o Maia e o Danilo passam todos os treinos para a gente, as estatísticas, tudo do nosso dia a dia. No nosso dia a dia, a gente faz churrasco, a gente tem as nossas resenhas. O clima entre os goleiros do Atlético é sensacional. A gente não tem o que reclamar. O Maia, o Danilo, o Everson, o Rafa e o Jean (quatro goleiro) são caras incríveis, de coração enorme, que estão ali para ajudar".
SE: Como foi aquele período em que você estreou pelo profissional do Atlético e, no jogo seguinte, pegou um pênalti?
MM: "Poder estrear foi uma coisa incrível. Não imaginava que na semana seguinte à que eu estreei - quando aconteceu a lesão do Rafa e eu entrei - eu entraria e poderia defender um pênalti. Mas foi mostrar um pouco do que nós, goleiros, passamos. A gente tem que estar sempre preparado para o que vier, porque uma bola que vem pode ser crucial em relação a vitória ou derrota. Não imaginava nunca poder, em uma semana, estrear e no outro jogo pegar um pênalti".
SE: São apenas três jogos pelo Atlético. Muitos te conhecem pelo período no CSA, mas vários torcedores ainda não te viram jogar com frequência. Quais são suas principais características?
MM: No CSA, eu pude mostrar um pouco. Foi muito bom poder ter saído e mostrado, já que nunca tinha jogado profissionalmente. Isso que me ajudou a criar cancha para conseguir fazer esses três jogos pelo Atlético. Sou um cara muito tranquilo e gosto de passar total confiança no gol. Gosto de sair jogando com os pés, tenho uma envergadura muito boa, sou bem grande. Acho que minha virtude mesmo é a tranquilidade. É onde me sobressaio para poder lidar com o jogo, é essencial.
Acompanho o carinho que a torcida do Atlético tem por mim, apesar de serem só três jogos, mas o pessoal viu bastante na Série B (pelo CSA). É muito legal e gratificante ter a torcida ao meu lado".
SE: Você fez parte desse grupo vencedor. Por que este Atlético deu tão certo?
MM: "Acho que foi a 'liga' que deu. Tem muitos jogadores de nome e a gente pensa que pode ter intriga, mas não teve nada disso. O pessoal se fechou muito e isso foi essencial para a gente conquistar os títulos. Um jogador pode se destacar num jogo, mas depois precisa do time todo. Um exemplo foi o jogo do Grêmio (derrota por 4 a 3 na última rodada do Brasileirão), em que o pessoal descansou para jogar contra o Athletico-PR no primeiro jogo da final e deu no que deu: 4 a 0, quando o pessoal estava com combustível de sobra. Isso é muito importante, o pessoal se uniu bastante e isso foi essencial para as conquistas dos títulos".
SE: Para o ano que vem, você prefere ficar no Atlético ou sair para ganhar rodagem e voltar depois mais preparado?
MM: "O plano, até então, é continuar no Atlético. Não chegou nada de empréstimo, venda e nada. Qualquer coisa que chegar, a gente vai conversar, meu estafe vai conversar com o Atlético. Mas até então estou feliz no Galo, pretendo ficar e fazer parte do grupo no ano vem".
SE: O Atlético vai dar mais rodagem aos jovens na fase inicial do Mineiro. Quando você se reapresenta? Volta junto do elenco ou antes? Houve algum tipo de conversa para você ou o Rafael jogarem mais?
MM: "A expectativa é que dê rodagem ao pessoal que jogou menos, também para descansar o pessoal que jogou mais este ano. Mas a gente se reapresenta dia 17 (de janeiro). Não houve nenhuma conversa. A gente está de férias, então o pessoal quer descansar. Este ano foi muito cansativo, com muitos jogos. É descansar mesmo e se reapresentar no dia 17. O que for decidido eu tenho certeza que vai ser o melhor para o Galo".
SE: São quase dez anos de Atlético, que estão no passado e você carrega como bagagem. E para o futuro? Quais são seus sonhos para daqui para frente no Galo?
MM: "Meu sonho para o futuro é sempre conquistar títulos com esta camisa, dar alegria para a massa atleticana como foi este ano. Eu tão novo sentindo esse gostinho de título é sensacional, não tenho nem palavras para descrever. Nos próximos anos, eu pretendo dar muito mais títulos. É isso o que todo jogador pensa e é o meu pensamento também".