Levir Culpi está de volta ao Atlético.
Leia abaixo a íntegra da entrevista coletiva de Levir Culpi
Volta ao Atlético
É um prazer estar aqui mais uma vez, é a quinta. O Gallo aqui também do lado, com a comissão técnica, que conheço quase todos. Me sinto muito bem e forte aqui no Atlético. Em relação ao time, é uma coisa engraçada, porque alguns times reagem de maneira diferente sob alguns comandos. Então, eu quero conhecer alguns jogadores. Ainda temos um período de dez jogos aproximadamente. Nesse período, vou ter oportunidade de definir e conhecer melhor os jogadores. Para conhecer um jogador, é necessário que você tenha um bom ambiente também no clube. Se você não proporciona um bom ambiente aos jogadores, você não tira nada deles. É como nós. Nós temos que estar em um lugar onde nós possamos nos sentir bem. A produtividade vem naturalmente. Conversei rapidamente com eles hoje para falar sobre isso. Quero observar alguns jogadores, porque o Atlético tem um elenco que eu considero bom. Tem bons atletas. O número de atletas também é alto, não é um elenco pequeno. Não é tão difícil. Se você fizer um número de gols, de assistências, temos uma maneira de dizer se foi baixo ou alto o nível de produtividade. Realmente, o Atlético ficou aquém do que pode oferecer. Mas ficou aquém por quê? Esses jogadores podem oferecer mais do que isso. Talvez isso tenha acontecido também. Esse período é importante para eu conhecê-los e para tomar algumas decisões já para a temporada que vem. Aí você conhece uma pré-temporada diferente, com espírito, um ambiente diferente, um objetivo diferente. E tenho certeza que juntos mais uma vez vamos virar isso aqui. Vamos virar, e o Atlético vai voltar a aumentar o número de pessoas que frequentam os hospitais aqui de BH.
Força do elenco e do time
Eu não consigo ver um time do nível do Atlético longe das conquistas, porque é muito legal. Eu, que participei de algumas, é muito bacana, é muito emocionante. Não é a questão financeira, é uma questão de orgulho, de emoção, que não tem preço. Espero que os atletas que trabalhem comigo estejam primeiro pensando nisso. Quero que eles sejam felizes.
Promessa de emoção?
É porque é uma verdade. Nunca falei isso, mas sempre aconteceu. Cada vez que vim para o Atlético tem emoção, tem jogos espetaculares. Se a gente for contar aquelas duas passagens contra Flamengo e Corinthians, não existe aquilo. Foi um negócio absurdo. O que foi aquilo? Uma simbiose de torcedor, jogadores, com a camisa do Atlético. Aquilo não tem explicação muito lógica. Aquilo não foi parte tática, alto nível técnico-tático. Aquilo foi emoção pura. O prazer que aquilo passou para todos os que estavam foi inesquecível. Por que não repetir? Por que não? Vale a pena tentar. É muito difícil conquistar as coisas. Os times são bons, os times têm o mesmo nível. O futebol brasileiro nunca esteve tão nivelado por baixo, é a minha opinião. O futebol brasileiro já esteve bem melhor nivelado por cima. Então, cabe a nós reerguer novamente essas disputas e conquistar títulos para sentir aquela emoção de novo.
Motivo de ter retornado
O que me fez retornar foi aquele ditado, que fala que a língua é chicote da bunda. Acho que foi isso. Porque no futebol não existe uma verdade. É impressionante. Existe uma lógica. Acho que essa é uma boa frase. No futebol, existe uma lógica, não existe uma verdade. Mas a lógica é facilmente destruída. Isso é um ponto fundamental. É isso que mantém o interesse pelo esporte. O mais fraco pode vencer a qualquer momento. Isso que é o bacana, o bom. Se todos os times organizados vencessem todos os jogos, não teria graça. Essa é uma das coisas que fazem bem para o nosso esporte. A tua pergunta não tinha nada a ver com isso, não é? (risos)
Vontade de voltar
São aquelas coincidências. Eu tinha contrato ainda, mais um ano no Japão. Mas eu rescindi o contrato e vim para cá. Quando vim para o Brasil, coincidentemente o Atlético foi me procurar. Me deu mais essa oportunidade. Fiquei pensando: por que não? Por que não? Nas outras quatro vezes, fui muito feliz aqui. Tenho uma afinidade muito grande. Sei lá. Não sei porque, mas aconteceu. Por que não? Por que deixar passar esta oportunidade? Então, espero sentir as mesmas emoções que senti no passado. Só peço isto: que a torcida esteja comigo, esteja com o grupo, não largue clube, senão perde a graça completamente. Pode até vaiar, mas o estádio tem que estar cheio. Tem que estar lá. A gente vai fazer o time jogar. Nós vamos para cima de todo mundo. O Atlético tem que jogar para vencer. Estou acompanhados de amigos. Tenho muitos amigos ainda na comissão técnica, que permanecem. Conheço todo mundo. Me sinto muito bem aqui. O que eu quero é ser feliz e deixar todos os atleticanos felizes.
Troca de treinadores no Brasil e cenário do futebol nacional
Falar sobre troca de treinadores no Brasil é realmente um negócio meio… Essa crítica cabe também ao Atlético. Acho o seguinte: a partir do invento chamado… de um profissional chamado agente de futebol, o futebol ficou bem mais difícil aqui no Brasil. Vou explicar o porquê. O ouvinte não sabe bem o que estou falando. O agente do futebol é esse agente que é o dono do passe dos jogadores, dono do passe do técnico e que negocia com os clubes para colocar jogador e tirar jogador. Então acontece o seguinte: de uns anos para cá, se tornaram muito normais as negociações. Então, os clubes estão jogando muito com os elencos. Sabe como? E os empresários estão no meio. Por exemplo: as negociações são gigantescas às vezes. Você está lidando com dólar, libra. Não tem como competir. Eu conhecia as escalações de quase todos os times do Brasil na década de 1970, 1980. Conhecia. Agora, não conheço a escalação de 11 jogadores de um time só. Eu não conheço, apesar de eu trabalhar com isso, eu não conheço a escalação titular dos times. Você pega uma Seleção Brasileira, por exemplo, e a gente não conhece os jogadores da Seleção Brasileiro. Porque com 16 anos ele dá um chute lá no Flamengo, no Fluminense, aqui no Atlético. Aí com 17 vai para a Inglaterra e daí para a Seleção Brasileira. E a gente não sabe quem está jogando lá. Não é culpa. Não vou culpar ninguém, mas o momento do futebol é esse. A gente não conhece os jogadores. Eles não ficam mais nos clubes. As vendas são astronômicas, e o clube não pode deixar de vender um jogador por 70, 80 milhões de euros. Os clubes estão endividados. Então, é importante também a venda de jogadores. Mas pode ver: perdeu-se a identidade da escalação do time. Poucos conseguem manter uma base de 11 jogadores, que você saiba a escalação. Este ano, por exemplo, estamos terminando o ano. Se perguntarmos para vocês a escalação dos principais times do país, a gente sabe pouquíssimos. Perdeu o controle, a qualidade de jogo. Perde a qualidade de jogo. Os meninos jogam aqui, por exemplo, no Atlético ou no Cruzeiro, pensando em ir para China ou pensando em ir para a Europa. Isso pesou muito também para a qualidade técnica. Além disso, ainda entram outras coisas. Nós estávamos conversando sobre o VAR, essa nova tecnologia para arrumar confusão. Marcação de pênalti ou não pênalti, impedimento, e outras coisas que atrapalham muito o futebol. Os bastidores também. Se você considerar o que é a CBF hoje... Sinceramente, ela não deixa de ser um reflexo do que é o futebol brasileiro. Então, a luta é grande, a luta é grande. Times como o Atlético têm que lutar aqui dentro para deixar um time com uma base sólida, uma base que o torcedor saiba o time, saiba a escalação. Eu trabalho por isso. E buscar títulos. Acho que é o melhor caminho mais correto que tem. Segurar um pouco pelo menos, para que o cara se torne ídolo do time, para que depois seja. A gente tem que lutar um pouquinho por isso ou pelo menos observar isso, senão não vai acontecer nada diferente.
O que o Atlético precisa para conseguir vaga na Copa Libertadores?
Eu falo o seguinte: fecha o grupo. Se o grupo estiver fechado... Se conseguir fechar o grupo, o grupo pode ter um nível baixo. Tem um nível baixo, mas não perde. Sabe como? Tem um nível baixo, mas põe a camisa, entra e não perde. Entra para ter resultado. E você consegue. O nível baixo que falo no futebol brasileiro é nota 7 para cima... Todos os times têm jogadores com esse nível. Então, é questão também de organização tática, técnica. Entra o técnico, é trabalho meu. Tem que fazer o time correr. Tem que fazer o time correr junto, não deixar o time espalhado. Essas coisas que pertencem ao técnico também, ao conjunto, ao interesse dos jogadores, de se abraçarem para conquistar alguma coisa. É muito mais que contratar. No Brasil, podemos citar o Palmeiras. O Palmeiras fez um investimento pesado, pesado. O elenco tem praticamente dois, três times. É um investimento pesado. Está colhendo resultados. Se investe forte, também consegue. Mas a outra forma é essa. Tem a categoria de base. Sei que tem ótimos jogadores na categoria de base também. Por que não aproveitar?. Isso depende muito do trabalho, do dia a dia, da organização do clube, da proteção do clube e dos jogadores, de eles se sentirem seguros, da força da torcida. Isso pode projetar o time. É o que nós pretendemos fazer pelo menos neste final de ano.
Negociações com o Atlético enquanto Thiago Larghi estava empregado
Sabe quantas vezes já fui demitido… Imagina quantas vezes eu já fui demitido com os dirigentes conversando com um outro técnico. Tem que saber se colocar no lugar dos outros. Se coloca no lugar do Thiago: você vai ficar chateado. “Pô, sou técnico aqui, não me chamaram”. Mas eles vão contratar um técnico. Tem que ver se tem a possibilidade de contratar ou não, se eu venho ou não venho, se eu quero vir ou se eu não quero, sei lá. A situação é essa. Para mim, chegou que eles chamariam o técnico e iam demitir e eu seria contratado. Não vejo nada demais, porque aconteceu comigo dezenas de vezes. Certamente ele fez um bom trabalho aqui também, segundo a diretoria. Mas a diretoria já pensa para o ano que vem. A ideia é já observar algumas coisas este ano. Tomar umas atitudes este ano já, para o ano que vem. Foi uma atitude da diretoria, não minha. Não procuro saber exatamente o que está acontecendo. Ninguém pergunta para mim quando vou ser demitido, se quero sair ou não quero sair. O cara vem e me demite. Funciona mais ou menos assim. É triste, mas é duro.
Atlético com outros técnicos
Eu às vezes faço esses cálculos. Até conversei com os jogadores. O que pode acontecer…? O que eu tenho que fazer com eles que a diretoria, que a comissão técnica e que outros técnicos não fizeram? O quê? Vou procurar trabalhar da minha maneira. Não sei exatamente o que os outros técnicos fizeram, que tipo de psicologia, a parte psicológica, como foi usado, que plano usaram, que sistema tático… Não sei exatamente as palestras, os treinamentos. Não sei exatamente o que aconteceu aqui dentro do Atlético. Vou saber o que vai acontecer a partir de hoje, que é quando nós vamos comandar. Prefiro não analisar o que os outros fizeram, prefiro acreditar no que vou fazer.
Como as passagens anteriores podem ajudar?
É aquela coisa que não está escrito. É o carisma. Quantas vezes vocês viram um clube mudar de rumo? Quantas vezes? O time estava em último lugar e de repente vai, começa a subir. O que acontece? De uma hora para outra começa a ganhar. O que está havendo? Tem alguns segredos que nós desconhecemos. A parte psicológica, a parte emocional, no brasileiro é muito envolvente, muito envolvente. Acho que um bom ambiente. O atleta tem que ter uma leitura fácil do jogo... Você tem que fazer ele entender. Não adianta trazer uma tática complicadíssima para o jogador, que às vezes ele não consegue entender. Às vezes, ele está no lugar errado. É uma série de coincidências. Tem que colocar o cara no lugar certo. Por exemplo, o Luan. Lembra o Luan, que não se dava bem em alguns lugares do campo? Mas em alguns lugares ele produz mais. É uma série de segredinhos que tem no futebol que você precisa descobrir. Quando você consegue encaixar o grupo todo... Por isso que falei de problemas do futebol. Quando o time consegue encaixar e ganha sete jogos, três vão para a Europa. É mais ou menos por aí. E aí começa... Já mexe de novo. Está acontecendo muito também. O segredo é esse: ninguém sabe o que que é (risos)
Intenções táticas para o Atlético
Eu, na verdade, tenho pouco conhecimento. Assisti a poucas partidas do Atlético. Tenho pouco conhecimento do elenco. Quero conhecê-los nos treinamentos e também nos jogos para ter a minha visão da capacidade deles, inclusive para definir plano tático. Não tem plano tático definido antes de vê-los. Às vezes, as coisas acontecem naturalmente. Quero observá-los primeiro para depois tomar uma decisão tática de escalação
Elo entre profissional e base
Normalmente, quando tem jogo no domingo, por exemplo, na segunda os jogadores que não atuaram, procura-se dar um trabalho equivalente a um jogo. Seria o coletivo. E a gente procura fazer um coletivo com a base normalmente. Porque você faz com que eles tenham praticamente o mesmo nível de empenho, de esforço físico, e você também observa os meninos. Também estou sempre em contato com a comissão técnica da base. Eu gosto muito de participar, de ver os atletas. Um time que tem a base como a do Atlético merece esse respeito, esse tratamento. Muitos jogadores comigo e outros técnicos saíram da base e viraram ídolos.
Sistema de jogo do Atlético
A ideia (para o time) é fazer o sistema mais simples: o 10-10. O 10-10: dez atacam e dez defendem. É um pouco mais simples. Por aí.
Saída do clube em 2015 e volta agora
Você vê como a gente fala bobagem (risos) A gente fala muita bobagem (risos). Sinceramente, o que quero preservar é isso. O único medo que tenho por ter voltado para o Atlético é justamente isto: arranhar o tempo que nós tivemos juntos. Mas se você tiver medo disso, você não vai ser técnico. Se você tiver medo, você não vai ser técnico. Então, aceitei o desafio, porque penso que posso ser mais feliz ainda do que fui. Por que não? Por que não? Convido a todos os atleticanos para me vaiarem, mas que estejam no campo, estejam com a gente lá. Uma coisa eu tenho certeza, e eu vi na fisionomia dos jogadores: a gente vai dar 100%, vai dar 100%. Isso pode levar o Atlético a grandes resultados.
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