Parceiros no desenvolvimento do projeto do novo estádio do Atlético, a Arena MRV, estão certos de que com o modelo escolhido o espaço multiuso será construído sem um centavo dos cofres do clube. E, principalmente, que vai render lucros ao Galo. Aprovada com certa facilidade no Conselho Deliberativo (325 votos a 12), a moderna casa alvinegra vai tentar agir na contramão de times do país que disputam a Série A, cujos estádios próprios tiveram déficit e dor de cabeça, sobretudo aqueles erguidos depois da Copa do Mundo de 2014. Para isso, a inspiração veio de gigantes como a Juventus-ITA e, em parte, o Palmeiras, um destaque positivo entre os exemplos brasileiros.
Depois do aval dos conselheiros, o assunto já tem data para ser discutido na Câmara Municipal de Belo Horizonte: 17 de outubro. A audiência pública vai avaliar os impactos econômicos e ambientais na execução da obra, prevista para começar em março e ser finalizada em outubro de 2020, o que representaria 32 meses de trabalhos. De acordo com o requerimento, Daniel Nepomuceno terá convite duplo: o presidente do Atlético vai representar também a Prefeitura, já que ocupa o cargo de secretário de Desenvolvimento Econômico.
Segundo o projeto atleticano, os recursos da Arena MRV virão da venda de 50,1% do Shopping Diamond Mall ao Grupo Multiplan (R$ 250 milhões), dos naming rights (R$ 60 milhões) e da comercialização de cadeiras cativas (R$ 100 milhões). Com isso, a diretoria atleticana promete conservar os investimentos em futebol, como contratações de jogadores de peso, manutenção da Cidade do Galo e ampliação do programa Galo na Veia.
Inspirado no sucesso da Juventus na Itália, o Atlético tenta ser uma referência positiva no Brasil com gestão estratégica. Dos grandes clubes nacionais, somente o Palmeiras não tem prejuízo com sua arena, o Allianz Parque. Além dos naming rights assegurados, o alviverde tem para si toda a receita dos ingressos – a parceira, Wtorre, lucra com os eventos e shows. Em contrapartida, Corinthians, Atlético-PR, Grêmio e Internacional, que reformaram suas casas recentemente, convivem com sérios problemas, o que afeta seus balanços financeiros. E as dificuldades são de diferentes naturezas: empréstimos altos, negócios ruins ou mesmo fracasso de público ou eventos.
Os demais times brasileiros que já possuíam estádios há décadas também enfrentam contratempos na relação custo-benefício. Um dos casos mais clássicos é o do Santos, que arrecada menos do que se espera na Vila Belmiro pela baixa capacidade (apenas 16 mil pagantes) e tem de atuar no Pacaembu em grandes jogos. Outro praticamente forçado a mudar de campo é o Sport, que consegue mais lucro na Arena Pernambuco do que na Ilha do Retiro. Por outro lado, o São Paulo é visto como exemplo positivo: no Morumbi, o clube lucrou R$ 2 milhões em 2016.
Para o economista Fernando Lima, da FRT Sport, empresa de consultoria esportiva, o Atlético assume uma administração moderna ao não comprometer sua receita nos anos anteriores: “A Arena MRV é totalmente diferente, porque o Atlético conseguiu negociar ativos da construção e já tem R$ 110 milhões garantidos logo de cara. A única questão é com relação às 5 mil cadeiras cativas, que ainda terão de ser vendidas. O clube fez negociação sem questão bancária. Esse processo barateia o custo da obra. A probabilidade de dar certo é igual ao caso do Palmeiras, que lucra muito, mas tem uma ressalva: é obrigado a atuar alguns jogos fora por contratos de shows”.
Parceria
O especialista acredita que uma parceria na administração do estádio seria fundamental para melhorar o rendimento financeiro. A BWA/Luarenas, que divide os lucros do Independência com o Galo, já demonstrou interesse em trabalhar com a direção alvinegra para cuidar dos negócios da Arena MRV. “O produto final do Atlético não é gerir estádio e, sim, o futebol. Logo, seria prudente que o clube fizesse uma parceria com uma empresa experiente no ramo para facilitar a administração”, afirma Lima.
Já o consultor esportivo Amir Somoggi entende que o cenário dos estádios do país é desanimador, mas acredita que o Atlético pode vencer a barreira e fazer um negócio satisfatório. “O clube é um dos poucos a construir ativos com receitas futuras. Mas é um desafio enorme. Se olharmos as receitas dos clubes, vemos que 45% de cada ingresso vendido são destinados a despesas. Há, naturalmente, um ambiente difícil de ganhar dinheiro somente com o futebol. Mas o Atlético tem de se virar para arrecadar com outras atividades”.
Os principais estádios próprios do Brasil
Arena MRV
A perspectiva é de que o Atlético lucre pelo menos R$ 27 milhões já no primeiro ano de funcionamento, com ampliação do Galo na Veia, jogos, estacionamento, eventos e shows. Para isso, os dirigentes entendem que o clube deve administrar 100% dos negócios
Allianz Parque
Foi o primeiro estádio pós-Copa a ter vendido os naming rights. Na parceria com a Wtorre, que administra o espaço, o Palmeiras tem as rendas dos jogos e a empresa fica com a receita das demais atividades. No ano passado, a arena arrecadou R$ 150 milhões entre jogos e eventos
Arena da Baixada
Administrado pela G3 United, o estádio está distante de arrecadar com grandes eventos e shows. São R$ 120 milhões em dívidas a longo prazo. E o clube tenta dividi-las com a prefeitura de Curitiba e o governo do Paraná
Arena Grêmio
Em situação semelhante a do Corinthians, o clube não vê renda dos jogos no estádio construído pela OAS – envolvida na Operação Lava-Jato – e ainda tem de completar o caixa para evitar os constantes prejuízos. O tricolor tentou, sem sucesso, comprar 50% da arena junto à OAS. A outra parte pertence ao clube
Barradão
O Vitória recebe todos os lucros do estádio inaugurado nos anos 1980. E com custos de manutenção dentro da realidade financeira, o clube consegue lucrar um baixo valor
Beira-Rio
A holding Brio (Andrade Gutierrez e BTG Pactual) administra conjuntamente o estádio com o Internacional. Em três anos, o prejuízo foi de R$ 136 milhões, a maior parte de alto juros pelo empréstimo, que foi de R$ 350 milhões, para financiar a obra. O clube só ganha com ingressos de 47 mil lugares
Couto Pereira
O estádio antigo e sem luxo é administrado totalmente pelo Coritiba, que gasta R$ 10 milhões mensais para mantê-lo. E ainda arrecada com shows, como o do Maroon 5, no início deste mês
Ilha do Retiro
Com uma arrecadação média de R$ 216 mil no estádio, considerada inviável nos dias atuais, o Sport frequentemente joga na Arena Pernambuco, onde consegue R$ 650 mil de renda média
Itaquerão
Um dos que mais dão prejuízo. O Corinthians é obrigado a ceder sua renda dos jogos para pagar o empréstimo à Caixa, na casa dos R$ 3 milhões mensais. O custo total é de cerca de R$ 2 bilhões, a serem pagos em 20 anos. O clube não conseguiu vender os naming rights
Moisés Lucarelli
Um dos poucos estádios particulares antigos que dão prejuízo. A Ponte Preta tem uma renda média de R$ 100 mil por jogo, mas gasta R$ 105 mil na sua manutenção. Para amenizar a conta negativa, o clube aluga o estádio para o Red Bull Brasil
Morumbi
Enquanto as arenas da Copa tiveram prejuízos, o tricolor acumula superávits a cada ano. Em 2016, lucrou R$ 2 milhões com jogos e shows. O estádio é 100% administrado pelo clube, sem participação de parceiros
Ressacada
Em geral, não dá problema para o Avaí. Seu custo de manutenção por jogo é relativamente baixo (R$ 85 mil), o que garante ao clube pequenos lucros mensais
São Januário
Gerido pelo Vasco, o estádio deve terminar 2017 com prejuízo, já que o clube deixou de arrecadar depois da punição imposta pelo STJD pelos incidentes no clássico com o Flamengo. Para jogar em São Januário, o clube tem custo operacional de R$ 120 mil por partida
Vila Belmiro
Pela baixa capacidade (apenas 16 mil), o Santos dificilmente arrecada muito no estádio e tem atuado com frequência no Pacaembu, onde tem torcida maior e público mais recheado. O clube tenta construir um novo estádio