“Eu ficaria no América independentemente de qualquer situação”. As palavras são do goleiro Fernando Leal, de 37 anos, que está no Lanna Drumond desde julho de 2014, quando foi contratado ao Fortaleza para ser titular no lugar do prata da casa Matheus, vendido ao Sporting Braga, de Portugal, por mais de R$ 7 milhões. À época, ele mostrou alto nível em suas defesas e colaborou para que o Coelho terminasse o turno da Série B em terceiro lugar, com 33 pontos. Uma lesão muscular na coxa direita, porém, abriu espaço para a concorrência. E João Ricardo, que inicialmente seria reserva, entrou no time para não sair mais. Desde então, o camisa 1 disputou 214 jogos e ganhou notoriedade no mercado da bola. Clubes como Vasco, Botafogo, Goiás e Chapecoense sondaram sua situação junto ao empresário Fábio Beitler. O América, ciente das investidas, propôs quatro anos de contrato e aumento salarial. A resposta ainda não aconteceu.
Enquanto isso, Fernando Leal, que contabiliza 26 partidas a serviço do América, segue à espera de um contato da diretoria, mas sem criar muitas expectativas por uma permanência em 2019. Ele sabe que o clube, em uma eventual transferência de João Ricardo, aventa a possibilidade de contratar outro goleiro, além de mantê-lo como possível alternativa. No elenco ainda há os pratas da casa Jori, de 22 anos, e Glauco, de 23. “Sabemos que o futebol é dinâmico e eles podem estar à procura de outro goleiro que seja melhor para eles e para o clube. Mas existe sim uma esperança de ter o contrato renovado novamente”.
Natural de Uberaba, no Triângulo Mineiro, Fernando Leal começou a carreira no Cruzeiro, em 2000, e passou por vários clubes, entre eles Ipatinga, Bahia, Vitória, Barueri, Mirassol e Oeste. Por este último, ganhou notoriedade nacional ao fazer o único gol da carreira em cabeceio aos 48min do segundo tempo do jogo contra o Avaí, pela primeira rodada da Série B de 2013 (empate por 1 a 1). Com a trajetória longa no futebol, ele recebeu três propostas de fora de Minas Gerais: de um clube do Rio Grande do Sul, do Ituano-SP e do Santa Cruz. Mas justamente por estar estabelecido em Belo Horizonte, ao lado da esposa, Nathália, e dos filhos Matheus, de 14 anos, e Ana Clara, de 11, é que o experiente jogador reforça o projeto de seguir no América. Em entrevista ao Superesportes, ele conta os planos em curto e longo prazo, deixa claro o sentimento de carinho pelo clube e recorda os momentos vividos nesses quatro anos e meio.
Como está a expectativa em relação à renovação de contrato com o América?
“Tenho a esperança de um contato. Tive um pequeno contato com o Luiz (Kriwat, gerente de futebol). Estava numa indefinição, e a gente fica aguardando. Mas, até o momento, não tive um retorno. A minha vontade realmente todos sabem. Já são cinco temporadas, sendo quatro anos e meio. Fui muito bem recebido no clube desde o início, sou mineiro, tive adaptação boa a BH, inclusive com meus filhos bem na escola. Foi muito importante esse período que estive no América. A gente fica, sim, na expectativa de ter um contato, mas sabemos que o futebol é dinâmico e eles podem estar à procura de outro goleiro que seja melhor para eles e para o clube. Mas existe sim uma esperança de ter o contrato renovado novamente”.
O Givanildo Oliveira sempre contou com você quando necessário. Ele pode ter influência em uma procura do América?
“O Givanildo dispensa comentários. Trabalhei por dois anos com ele, joguei pouco, mas foi um treinador que me apoiou nas duas renovações que tive com ele. Ele tinha demonstrado uma confiança muito grande no meu potencial. Espero que ele continue acreditando e queira continuar comigo no elenco. Com certeza seria muito bom estar mais um ano no América, ainda mais com o Givanildo, que é um técnico que nos passa total confiança em todos os momentos e sempre deixa o jogador à vontade para fazer o seu melhor. Isso é muito importante. A gente, quando tem uma pessoa igual a ele, fica sempre na esperança. Mas claro que não posso atrelar minha permanência apenas com o ‘sim’ ou o ‘não’ dele, pois hoje não sei o que passa pela cabeça da diretoria do América para saber se eles aprovam ou não minha renovação. Mas o Givanildo, se dependesse só dele, com certeza daria um sim para a minha renovação”.
João Ricardo e você são concorrentes por posição dentro de campo e amigos fora das quatro linhas. Ultimamente, o goleiro titular do América tem sido especulado em vários clubes da Série A do Campeonato Brasileiro, casos de Vasco, Botafogo e Chapecoense. Tem conversado com ele sobre o assunto?
“Nós conversamos muito. Ele é um cara que gosta muito do clube, é muito grato ao clube. A única coisa que ele me diz é que não definiu. Mas as demais coisas a gente não fica comentando, até porque é uma questão particular dele. Mas é um cara que gosta muito do clube. Em cinco anos convivendo com ele, vi que gostava muito. Assim como eu também gosto muito do clube. Hoje sou um torcedor do América em todas as questões, por tudo que o clube me proporcionou. O João pensa da mesma maneira. O que posso falar no momento é isso”.
O que pesa mais para sua carreira neste momento: renovar o contrato com o América e possivelmente ser reserva ou seguir para algum clube com chance maior de alcançar a titularidade?
“Eu ficaria no América, independentemente de qualquer situação. Lógico que o atleta quer jogar, e eu não sou diferente. Sempre que tive a oportunidade de jogar no América, graças a Deus eu pude corresponder. O América também reconheceu isso em vários momentos, então pode ser que pese ao meu favor. Lembrando que, o João ficando ou não, eu ficando ou não, tem o Glauco e o Jori, que são ótimos goleiros. Seria uma disputa muito grande. Nesse período que estou aguardando o América, já tive quatro propostas concretas, mas, que no momento, não foram interessantes ao meu modo de ver. Estou estabilizado em Belo Horizonte e espero uma resposta do América. Claro que se o América optar por não renovar comigo, não ficarei com mágoa alguma, até porque as propostas que tive não encheram os olhos. Sigo aguardando e, independentemente do que acontecer, vou torcer sempre pelo melhor do América”.
A estabilidade em Belo Horizonte tem grande influência em seu desejo?
“Minha estabilidade em Belo Horizonte pesa muito. Meus filhos estão grandes na escola. Minha esposa, né… a gente olha muito para o lado profissional, mas muitas vezes as pessoas se esquecem do lado família. Minha esposa tem os pais próximos de Belo Horizonte (são de Santa Bárbara, a 105 quilômetros de Belo Horizonte). Sempre que pode, eles estão perto e dão uma força muito grande a ela. Independentemente disso, o América sempre será a primeira opção. Se não for da vontade do América, entenderei, mas faz parte do futebol”.
Hoje, os goleiros jogam em alto nível mesmo em idade avançada. O maior exemplo talvez seja o Fábio, do Cruzeiro, que tem 38 anos e vive o melhor momento da carreira. Você, aos 37, pretende seguir até quando no futebol?
“A gente vê, hoje em dia, uma longevidade na profissão, ainda mais na posição de goleiro. Eu me vejo bem treinado. Isso vai muito do que você tem de estrutura e do clube no qual você está no dia a dia, do treinador de goleiros, das condições oferecidas, e o América nos oferece a melhor condição possível. Eu, sinceramente, se Deus abençoar e tudo der certo, minha ideia é, se tiver em alto nível, chegar até os 40 ou 41 jogando. Caso contrário, vou rever junto com a família a possibilidade de abreviar. Não é minha vontade, mas preciso ver o que vai acontecer. A princípio, é isso”.
Financeiramente e profissionalmente, você já se sente realizado?
“Graças a Deus tive uma carreira vitoriosa dentro da bola, por tudo que passei, por tudo que vivi, pela família que Deus me deu… tenho dois filhos, o Matheus e a Ana Clara. Claro que quanto mais estender o contrato e quanto melhor for o salário, lógico que você se aposenta melhor. Porém, o que eu precisava para a minha carreira, eu consegui. Não sei o dia de amanhã, mas hoje estou controlado, graças a Deus. Lógico que a gente sempre quer mais, pois temos filhos e sabemos o quão difícil é, temos gastos. Então a gente sempre espera ter um pouco melhor guardado para, no futuro, não deixar faltar nada. Estou tranquilo, a cabeça está boa. Não é fácil quando você vê que está perto de parar, mas me considero muito bem fisicamente e tecnicamente, até por ter pegado uma boa condição no América”.
Quais são seus projetos quando parar de jogar? Seguirá no futebol (treinador, auxiliar, preparador de goleiro, dirigente) ou investirá em outra carreira?
“Conversando com minha esposa, acho melhor deixar para quando poder parar, já com a cabeça boa. Estamos começando a caminhar algo, que, a princípio, fica entre minha família. Estou olhando algumas coisas sobre transporte, algo na construção civil, enfim. Aguardando o que Deus tem preparado para nós. Mas algo tem que fazer, né?! Quanto a continuar na bola, existe sim uma possibilidade grande, pois é algo que sei fazer e gosto. Agora vai muito do que acontecer e do que for oferecido. Tenho um planejamento para quando parar fazer um estudo sobre gestão e talvez fazer algum curso na CBF, de modo que eu veja se continuarei na bola ou não. É muito tempo longe de casa, fiquei muito tempo longe dos filhos, muitas concentrações, muitas decisões que, particularmente falando, minha esposa foi mãe e pai em vários momentos. Preciso ficar perto dos filhos um pouco mais para dar a eles mais atenção, mais carinho, porque eles merecem”.
Na campanha do título da Série B de 2017, você teve papel muito importante ao substituir o João Ricardo, que estava machucado. Foram cinco jogos, com três vitórias e dois empates. Conte um pouco mais sobre essa experiência...
“Foi a reta final. O jogo foi contra o Londrina, no qual o João saiu machucado. Eu fui bem naquela reta final, graças a Deus. Nós vencemos quase todos os jogos. O único resultado ruim foi contra o Boa Esporte, em que estávamos ganhando por 2 a 0 e levamos o empate no finalzinho. Mas depois vencemos o Guarani, o ABC e o CRB. Foram bons jogos e eu pude contribuir naquele momento em que brigávamos com o Internacional. Fico muito feliz de ter ajudado diretamente. Só há coisas boas para me lembrar do América. A única coisa ruim foi o rebaixamento deste ano, que me deixou muito triste, como todos do grupo. Agora é torcer para que o América continue crescendo sempre”.
O América começou bem o Campeonato Brasileiro de 2018 e chegou a sonhar com vaga na Copa Sul-Americana. No fim, acabou rebaixado à Série B, em 18º, com 40 pontos. Na sua visão, o que aconteceu para a queda tão brusca de desempenho?
“Nós contávamos muito com essa permanência. Ninguém, em momento algum, imaginou que isso aconteceria, por tudo que estávamos fazendo, pela boa campanha da equipe. Na reta final, nosso principal objetivo não foi alcançado. Todos nós que estávamos no América desde o início sabemos das dificuldades de conseguir um acesso, ainda mais sendo campeão da maneira que foi. Aqueles 11 jogos que ficamos sem vencer complicaram muito a nossa permanência. Ainda assim, ficamos à beira de sair da zona de rebaixamento. Mas tudo que acontece na nossa vida serve de aprendizado. O que podemos fazer é levar em consideração tudo que foi feito e pegar de experiência para que não aconteça novamente. Tenho certeza de que, em breve, o América voltará à Primeira Divisão”.
Mas houve alguma razão específica para o rebaixamento?
“Eu acho que a não continuidade de alguns jogos da mesma equipe, várias mudanças técnicas e táticas durante os jogos, a lesão de jogadores importantes naquela fase… tudo contribuiu para que isso não acontecesse e não houvesse ao menos uma vitória nessa série de 11 partidas (sem vencer, a maioria sob o comando de Adilson Batista). Isso ficou claro que em alguns jogos, quando você tem uma sequência de uma equipe que muda pouco, faz a diferença. Claro que você entende que o treinador tem o pensamento do que é melhor para a equipe e faz de sua vontade, mas talvez o que necessita no momento. Mas foi, já passou, que sirva de aprendizado para quem ficar no clube e para aqueles que fizeram parte naquele momento. Nós jogadores somos apenas funcionários e em muitas vezes não podemos intervir nas coisas que saem da nossa condição de atleta”.
O América vem no efeito pingue-pongue entre as Séries A e B: subiu em 2015, caiu em 2016, subiu em 2017 e caiu em 2018. Em 2019, o clube terá condições de novamente retornar à elite nacional?
“Com bastante tempo que estou na bola e também no América, digo que o clube sempre vai brigar, ainda mais se tratando de uma Série B. Tenho certeza que o América tem uma diretoria competente para montar uma equipe competitiva, de boa qualidade técnica. Tenho certeza que o América é um dos favoritos para voltar à Primeira Divisão em 2020, mais forte experiente”.