Agitado, Matheusinho se estica no sofá e volta os olhos para a TV. A pergunta para os amigos deixa clara a ansiedade do meia do América mesmo num momento de descanso na casa da mãe. Aos 18 anos, o garoto carrega consigo grandes responsabilidades - mas mantém preocupações comuns a, por exemplo, garotos que querem ser jogador: saber se está representado em um game de futebol.
“Esse é o FIFA 17. Acho que eu vou sair só em 2018. Os caras já olharam ali”, lamenta.
Sondagens
Para Matheusinho, estar representado no videogame é apenas um dos próximos passos da promissora carreira.
O meia viveu um 2016 intenso.
E, por conta das boas atuações, chamou a atenção e recebeu sondagens de clubes da Europa (Lille, da França) e do Brasil (como Cruzeiro, Grêmio, Internacional e Fluminense, em diferentes momentos da temporada).
Questionado se permaneceria no América em 2017, Matheusinho despistou e deixou a responsabilidade nas mãos do empresário e do clube mineiro.
“Foi ótimo saber que meu trabalho está sendo reconhecido mundialmente, uma coisa muito boa. Pretendo ficar no América. Se tiver alguma proposta, eles é que vão resolver para lá. Enquanto eu estiver no América, vou fazer de tudo para ajudar”, disse em entrevista ao Superesportes.
Para se precaver, o clube mineiro estendeu o contrato de Matheusinho até 2021, com multa para o exterior estipulada em 30 milhões de euros (mais de R$ 104 milhões na cotação atual). O América não informou a quantia cobrada para eventuais negociações locais.
‘Parças’ de Seleção
Em meio à ascensão no clube mineiro, Matheusinho chamou a atenção da imprensa e da comissão técnica da Seleção Brasileira olímpica. A promessa do América se destacou nos treinos com a equipe que viria a conquistar o ouro no Rio de Janeiro. Além dos dribles, assistências e golaços em cima do experiente Fernando Prass, Matheusinho conheceu ídolos - e fez deles amigos.
“Fiquei bem próximo do Gabriel Jesus, Neymar, Marquinhos, Gabigol. Sempre que tinha oportunidade, eu perguntava alguma coisa. Via o que eles faziam para aprender. E aí, depois do treino, jogávamos videogame, ficávamos na mesa para uma resenha, trocávamos uma ideia ‘da hora’. Tudo sempre sobre futebol”, conta.
Com Neymar, a relação foi especial.
“Eu fui perguntar para o Micale (Rogério Micale, treinador) se podia ir. Ele bateu ‘fortão’ nas minhas costas e falou: ‘Vai, sô, pode ir, está de boa’. Do jeito que ele falou comigo, eu pensei: ‘Ih, está de boa nada'. Se eu for, esse ‘trem’ vai dar m***.”, conta, aos risos (veja a história completa no vídeo abaixo).
“Medroso” para aceitar o convite de Neymar, Matheusinho se transforma em campo. Foram 23 jogos em 2016. Apesar de não ter marcado gols, chamou a atenção pela qualidade e facilidade no drible. Sempre com a bola no pé, tem aprendido a lidar com defensores.
“Eu jogava no meio de uns pernas de pau aí, e eles me ‘rachavam’ direto (risos). Eu chegava em casa todos os dias mancando. Agora, sou mais esperto.
Matheusinho tem apenas 1,64m. Nada que, segundo ele, o intimide. Desde criança, joga um futebol técnico - seja nas quadras da Escolinha do Licuri, no “terrão” do Zezé ou nos gramados de Forrobol e América. Para a mãe, Lélia de Araújo, a “ousadia” se mostrou ainda mais cedo.
“Ele começou a jogar bola na barriga, porque chutava que era uma maravilha (risos). Quando estava com o braço quebrado, queria jogar bola escondido. Faltou 15 dias na escola sabe por que? Para jogar. Eu não sabia, estava trabalhando. Eu só descobri porque veio um bilhete do Conselho Tutelar”, conta Lélia.
“Fiz uma brincadeira, um estilo diferente. Sou fã do Messi, então essa foi dedicada para ele. Ele foi a inspiração”, conta, tímido.
Simplicidade
A casa em que a mãe mora, pintada do verde do América, ainda mostra a simplicidade em meio à qual Matheusinho cresceu. O local foi um dos vários lugares em que o meia viveu. A separação dos pais fez com que ele, ainda criança, precisasse se adaptar.
“Apesar de separado, a gente viveu em prol dos dois . A maioria dos filhos criados com os pais costumam ‘desviar’ a cabeça. E só de ver os dois desse jeito é uma alegria”, diz Silvio Santos, pai e “motoqueiro particular” do jogador na infância.
Quando o pai não podia levar o filho para o treino, o jeito era ir de ônibus - se houvesse dinheiro para isso. Afinal, boa parte dos salários dos pais era destinada ao pagamento do aluguel - “fantasma” que ainda preocupa a mãe de Matheusinho.
“Nunca tivemos uma casa própria. É o sonho dele também. E creio o que ele pensa em primeiro lugar quando acontecer algo extraordinário na vida dele é a casa própria”, diz.
Casa própria em Minas Gerais ou na Europa, Lélia?
“Bom, para mim tanto faz (risos). Para ele, eu não sei. Para mim, onde ele for, eu vou. O pai dele também com certeza vai. Para a gente, não faz diferença. Estando todo mundo junto já basta”, brinca.
Leia abaixou outros trechos da entrevista de Matheusinho. Na conversa, o meia fala sobre trajetória, relação com Enderson Moreira e Givanildo Oliveira e momento do América.
Futebol na infância
“Matava aula, andava 1, 2 km para jogar bola. O povo gostava muito, marcavam jogo só para me ver jogar. Eu não sabia nem dar autógrafo, mas tinha que escrever o meu nome lá (risos). Eu gostava de fazer umas gracinhas, dar chapéu, caneta. Lá, o povo já não gostava. Por conta da minha idade também. Eu nasci em 1998 e jogava no meio de meninos de 1995, 1996”
Primeiros clubes
“Lembro da escolinha do Licuri, porque comecei lá. Começava 7h da manhã, numa quadra. Eu acordava 5h da manhã e sentava no sofá com roupa e tudo já, só esperando dar a hora de jogar bola. Às vezes, até dormia com a roupa inteira, com o meião e tudo pronto. Depois, passei pela escolinha do Zezé. Fiquei lá no Pedra Branca, jogando no campo de terra. Era muito especial para mim também, porque tinha vários amigos lá e foi lá que eu comecei a me dar bem mesmo em campo. Acordava cedo e às vezes nem tomava café, ia direto para a escolinha. De lá, passei para o Forrobol. Aí é que as coisas começaram a mudar mesmo. Comecei a jogar campeonatos importantes. Eu gostava também pelas viagens. Eu levava minha caixinha, colocava o sonzão e todo mundo curtia. Quando eu não levava, os caras endoidavam, me davam tapa na cabeça. Foi uma época muito boa. E agora no América, que teve algumas loucuras também que eu fiz. Eu tive que levar balão cheio d’água dentro do ônibus para jogar no povo que passava na rua. Eu levei, e os diretores deram uma bronca na gente”
Ídolos
“Neymar e Messi . O Messi é pequeninho também. Me inspiro muito nele, nas coisas que ele faz. Neymar é outro nível também. Os dribles, as coisas que ele faz. Sou fã desses dois caras”
Recuperação da lesão no América
“Graças a Deus consegui me recuperar bem. Me machuquei faltando quatro jogos para acabar o Brasileiro. Fiquei um pouco chateado, mas vida de jogador é isso. Mas agora já estou recuperado. É esperar chegar ano que vem para que eu possa evoluir mais ainda”
Poucas oportunidades com Givanildo
“Eu ficava bem afoito. Ficava bem empolgado ao ouvir a torcida gritar meu nome e não poder fazer nada. Eu acho que isso aconteceu por causa de medo dele de me colocar e as coisas não saírem do jeito que eles estavam querendo. Acho que não foi o momento certo de entrar, de estrear. Mas para mim foi bastante tranquilo. A gente (Matheusinho e Givanildo) sempre teve uma relação boa. Nos treinamentos, ele me ajudava e falava o que eu precisava. Mas eu via ali que não era o momento certo ”
Pressão por comandar meio de campo aos 18 anos
“Não me sinto pressionado. Se eu estou ali, dou conta de fazer meu trabalho bem feito. Para mim, não existe pressão, não”.