América
None

AMÉRICA

Auditor favorável ao Coelho criticou redação mal feita da CBF e 'violação à liberdade do trabalho'

Clube mineiro foi isentado da perda de pontos por Washington Rodrigues de Oliveira

postado em 30/09/2014 07:00 / atualizado em 29/09/2014 23:47

Redação /Superesportes

FENAPAF

Há pouco mais de duas semanas, o América perdera a disputa em primeira instância no Tribunal sobre a escalação do lateral-esquerdo Eduardo em quatro partidas da Série B do Brasileiro – uma como titular e três na condição de reserva (relembre aqui). Por 4 votos a 1, o clube mineiro teve retirado 21 pontos – 12 pelas partidas e nove por três vitórias – e despencou para a lanterna do campeonato, posição que ainda ocupa no mínimo até o julgamento no Pleno (quinta-feira, 02/10, às 10h).

Único a isentar o América da perda de 21 pontos - aplicou multa de R$ 2 mil por cada jogo de Eduardo -, o auditor Washington Rodrigues de Oliveira revelou os motivos que o levaram a discordar de seus colegas. Segundo ele, o artigo 49 do Regulamento Geral das Competições da CBF tem redação confusa e faz uma “violação à liberdade do trabalho”, pois um atleta que faz contratos curtos, de apenas três meses, corre o risco de ficar desempregado durante a metade da temporada.

No ano passado, Washington Rodrigues ficou de fora do julgamento que rebaixou a Portuguesa à Série B 2014 por “antecipar” sua escolha nas redes sociais. Na ocasião, ele sinalizou voto favorável ao rebaixamento da Lusa. A decisão de banir Rodrigues do pleito partiu de Paulo Valed Perry, presidente da 1ª Comissão Disciplinar do STJD.

Leia, na íntegra, o texto de Washington Rodrigues de Oliveira

1. Primeiramente, embora fuja da prática adotada neste tribunal, acerca da elaboração do voto vencido, o faço de acordo com a solicitação do patrono do denunciado.

2. Por segundo, respeitando o entendimento dos meus pares, ouso divergir do brilhante e profundo voto do relator DR. LUIZ FELIPE BULUS ALVES FERREIRA.

3. Entretanto, o aprimoramento da sociedade se dá no antagonismo de ideias e pensamentos, que nos levam a buscar um algo a mais na interpretação das normas, levando-nos a entender os fatos como um todo, e não apenas detendo-nos na letra fria da lei.

4. Feitos tais apontamentos, as razões para não seguir a orientação proposta pelo Douto Relator, decorre da não aceitação da norma exposta no artigo 49 do Regulamento Geral das Competições da CBF, como supedâneo a aquinhoar a irregularidade do atleta, de modo a impor o apenamento decorrente do artigo 214 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva.

5. Como é cediço, as normas devem estar em consonância com a hierarquia das leis, e como tal seguir sem qualquer conflito os princípios e orientações esboçados na Carta Magna, sob pena de maculá-la com a inafastável inconstitucionalidade da norma. E é nesse ponto que reside, uma das razões para entender pela inaplicabilidade da norma em comento.

6. É fato insofismável, que a adequação do artigo 49 do Regulamento Geral das Competições da CBF teve como norte a adequação do comando ao Regulations on the Status and Transfer of Players da FIFA (RSTP).

7. Assinale-se, ainda que o RSTP da FIFA em 29 de outubro de 2007, entrou em vigor em 01 de janeiro de 2008, conforme esclarece a Circular no. 1130 da FIFA, datada de 20 de dezembro de 2007.

8. Corolário, as normas esboçadas pela Confederação Brasileira de Futebol, notadamente o Regulamento Geral das Competições deveriam, DESDE 2008, estar harmonizada DESDE 2008, estar harmonizada DESDE 2008, estar harmonizadas com os comandos da entidade máxima do Futebol. comandos da entidade máxima do Futebol.

9. Eis, que apenas agora, com uma redação mal elaborada, feita sem a oitiva dos partícipes do espetáculo (atletas, clubes e árbitros), a entidade de administração do Desporto procede a mudança do regramento sem se importar com os efeitos nocivos da medida.

10. Ora, é certo que pela Lei 9.615/98, em seu artigo 30, disciplina que o contrato de trabalho deve ter como base o prazo mínimo de 3 (três) meses.

11. Sendo certo também que, consoante comando do RSTP, artigo 18.2, o período mínimo de contrato, deve corresponder ao período de inscrição, até o final da temporada.

12. Dessa feita, como harmonizar o coando do artigo 18.2 com o artigo 30 da Lei 9.615, bem como, com o Direito ao Trabalho, consoantes comandos constitucionais?

13. Decerto, passa pela interpretação constitucional do artigo 49 do Regulamento Geral das Competições da CBF, como forma de não contaminar-se com a inconstitucionalidade do dispositivo. E é isso que fazemos!

14. A interpretação efetuada pelos meus pares aceita que o atleta que tenha laborado em 3 (três) clube diferentes, efetuando-se o contrato de trabalho em cada um deles, pelo período mínimo da legislação desportiva 3 (três) meses, estaria proibido de disputar por um 4o (quarto clube). Sendo que o período de 3 (três) meses sem que pudesse efetuar um contrato, disputar competições e laborar livremente, seria legal e constitucionalmente aceito.

15. Com a devida vênia, não há como aceitar que a imposição de um cerceamento à liberdade ao trabalho possa ser tido como constitucional, legal e justo.

16. A regra geral dos contratos de trabalho efetuados e registrados perante a Confederação Brasileira de Futebol, tem como regra o período de 3 (três) meses. Contratos acima desse período constituem a exceção.

17. Assim, não há como aceitar que todo o regramento seja feito para preservar a exceção, e não a regra.

18. Aceitar a redação proposta pela Confederação Brasileira de Futebol (artigo 49 do RGC), para a qual o atleta pode ficar 3 (três) meses durante o ano sem poder exercer o direito, caso já tenha trabalhado em 3 (três) clubes diferentes, impõe uma flagrante violação à liberdade ao trabalho e à dignidade da pessoa humana.

19. Como bem disse o saudoso Gonzaguinha, em sua célebre canção Um Homem Também Chora (Guerreiro Menino):

Um homem se humilha
Se castram seu sonho
Seu sonho é sua vida
E vida é trabalho
E sem o seu trabalho
O homem não tem honra
E sem a sua honra
Se morre, se mata
Não dá pra ser feliz


20. Parafraseando Gonzaguinha, “não dá pra ser feliz”, em se aceitando, passivamente, os comandos propostos pela Confederação Brasileira de Futebol, dado seus efeitos maléficos na ocorrência do desemprego.

21. Aliás, ressalte-se que o próprio patrono do terceiro interessado (quem fez a notícia de infração, o Joinville) deu perante a tribuna o depoimento de quê o clube ao qual representa, deixou de contratar atletas que já tivessem laborado em 3 (três) outras equipes.

22. O vínculo desportivo é acessório ao contrato de trabalho, e como tal não se pode aceitar que a diretriz esboçada pelo acessório, possa ser a mola propulsora do principal. Mormente quando desrespeita um comando constitucional.

23. Por outro lado, há que se assinalar, ainda, que a Confederação Brasileira de Futebol tendo em vista administrar a competição na qual disputa o denunciando, tem o dever e obrigação de constatar a regularidade do atleta, senão para cada partida, mas ao menos para a competição.

24. Caberia a CBF - enquanto realizadora e administradora da competição -, informar ao clube, da condição de jogo do atleta para a disputa deste campeonato

25. Entretanto, quedou-se - como ainda se queda – inerte para assinalar a irregularidade do atleta, e não ofertou, ainda, notícia de infração disciplinar ou comunicação de qualquer irregularidade. Muito embora o comando explicitado no artigo 52 do RGC, deixe claro a obrigação do DCO da CBF: “A DCO, verificando que um clube incluiu na partida atleta sem condição legal, encaminhará necessária e obrigatoriamente a notícia da infração ao STJD, ao qual competirá a aplicação de pena, nos termos do que dispõe o CBJD”.

26. Vê-se, pois, que a prerrogativa de informação da irregularidade na condição de jogo, caberia à DCO da CBF, a qual apenas informou os contratos dos atletas e as partidas que disputou, sem fazer qualquer comentário acerca de sua regularidade – ou não. Isto após pedido da Procuradoria deste STJD, também depois da notícia feita pelo clube Joinville.

27. Decerto, se a DCO da CBF o habilitou para a disputa do campeonato, não há que se falar em irregularidade na disputa das partidas em questão.

28. Assim, entendo que houve o desrespeito do clube ao artigo 49 do RGC o qual, todavia, não tem força legal para aquinhoar a irregularidade do atleta para a disputa das partidas assinaladas.

29. Se lhe foi dada condição legal ao atleta para participar do campeonato brasileiro da série b de 2014, por imperativo legal, ele a tem para a disputa das partidas mencionadas.

30. Apenas para esclarecer aos incautos que possam fazer desse apontamento uma regra, não se trata obviamente de assinalar que se o atleta condição legal consoante permissão da DCO da CBF ele a terá para participar de toda e qualquer partida.

31. Obviamente que não, as punições impostas pelo STJD e pelo árbitro (cartão vermelho ou terceiro amarelo), impedem o atleta de participar da partida subsequente.

32. Mas aqui estamos diante da suposta, impossibilidade de participar não da partida, mas da própria competição, ao qual foi dada condição legal.

33. Assim, entendo que o denunciado incluiu atleta que tinha condição legal para participar do campeonato, e consoante, das partidas em questão.

34. Contudo, desrespeitou o regulamento, e se o mesmo não tem o condão de criar uma ilegalidade na condição de jogo do atleta, tem em relação ao denunciado por não se adequar a uma mera deliberação.

35. Ante essas considerações, desclassifico a conduta do denunciado para o artigo 191, III do CBJD, aplicando-lhe a pena de a pena de R$2.000,00 (dois mil reais) por cada partida disputada ou que figurou no banco de reservas.

É como voto.

Rio de Janeiro, 15 de setembro 2014.

WASHINGTON RODRIGUES DE OLIVEIRA
Auditor 1a CD/STJD

Tags: serieb américa stjd