O Cruzeiro começou a campanha na Copa Libertadores de 1997 com uma derrota. Em 19 de fevereiro daquele ano, com 33.425 torcedores presentes no Mineirão, o time celeste perdeu para o Grêmio por 2 a 1, gols de Zé Alcino e Emerson, para os gaúchos, e Ailton, para a Raposa. Naquele jogo, a equipe mineira foi comandada pelo técnico Oscar Bernardi. Ele assumiu, no início do ano, o cargo que era de Levir Culpi, campeão da Copa do Brasil com o time em 1996 e que havia recebido uma proposta milionária do Cerezo Osaka, do Japão.
À época com 42 anos, Oscar era uma aposta da diretoria e do presidente Zezé Perrella, já que ele tinha pouca experiência como treinador. Antes do estreia na Libertadores, o Cruzeiro disputou quatro jogos. No primeiro, derrota para o Fluminense, em um amistoso (29 de janeiro, por 2 a 1, no Independência). Em seguida, foram três jogos pelo Mineiro, com duas vitórias (1 a 0 sobre o Montes Claros, em Belo Horizonte, e 3 a 1 sobre o Mamoré, em Patos de Minas) e um empate (0 a 0 com o Guarani, em Divinópolis).
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O futebol mostrado pelo time naqueles jogos deixou a desejar, e o treinador já era questionado no cargo antes da estreia na Libertadores. “Nos jogos, no início da temporada, no Mineiro, o time estava bem, em primeiro lugar. O time era bom, tinha bons jogadores. Mas me lembro que o time estava em formação, não estava totalmente definido. Alguns jogadores não estavam em forma, como o Gelson (Baresi), o Palhinha. Me lembro que lancei João Carlos (zagueiro, no time B), e ele foi bem”, relembra Oscar Bernardi.
Por conta da derrota para o Grêmio na estreia continental, o trabalho de Oscar foi interrompido. A sintonia entre comissão técnica e jogadores não era boa, conforme confirmou o meia-atacante Cleison ao Superesportes. “O Cruzeiro realmente não foi bem no começo da Libertadores. Nossa pré-temporada não foi legal. Nosso técnico era o Oscar, mas não tinha aquela sintonia entre comissão técnica e jogadores. E o Cruzeiro começou muito mal. Com a chegada do Paulo Autuori, os jogadores se uniram, tiramos energia de onde nem tinha e fizemos uma grande segunda fase da competição. O Autuori foi fundamental. Com muita conversa, com muita sinceridade. Um treinador espetacular, um ser humano inteligente. Jogador gosta disso, de sinceridade, de jogo aberto. E a gente correu pelo nosso treinador. No final deu certo”, lembrou o ex-jogador.
A versão do jogador foi confirmada por Oscar. “Eu fui demitido. Não estava um ambiente legal para trabalhar. Alguns jogadores estavam acomodados, já que eram titulares com todos os outros treinadores anteriores. Mas nome comigo não jogava mesmo. Se tiver em forma, joga. Mas se achar que com nome vai jogar, não vai”, disse. Questionado sobre um atrito que teria ocorrido entre ele e alguns jogadores, Bernardi minimizou. “Se teve algum atrito, foi coisa do futebol, de campo. Me lembro só que o Gelson veio falar comigo. Ele era titular e tal. Mas são coisas do futebol. Ele estava fora do peso, e teria que perder peso. Mas não teve atrito grave e eu não guardei nada disso. Tenho boa recordação de todos”.
O ex-técnico cruzeirense lembra que fazia de tudo para ser parceiro e justo com os atletas, até porque foi um zagueiro de sucesso, defendeu a Seleção Brasileira nas Copas de 1978, 1982 (capitão) e 1986, e sabia como lidar com um grupo. Ainda assim, a relação não deu liga. “Não sei por que a relação não estava legal. Se a gente é correto com os jogadores... O jogador tem que entender que o clube não é dele. E eu fui escolhido para decidir quem são os melhores. Tem muitos jogadores que pensam que são titulares e não têm outros (jogadores no elenco). Mas existem outros jogadores que querem a vaga também”, explicou Oscar, que hoje é dono do hotel e centro de treinamentos Oscar Inn, em Águas de Lindóia (SP). Anos atrás, o Cruzeiro já até utilizou suas instalações.
Ricardinho, Nonato e Célio Lúcio lembram importância da chegada de Autuori em 1997
Sem mágoas
Apesar da demissão prematura, Oscar lembra com carinho daquele período e garante que não ficou nenhum resquício negativo do clube mineiro. “Foi muito bom, foi uma experiência muito boa. Depois do Cruzeiro, fui para a Arábia, depois para o Japão. Mas nunca mais investi na minha carreira no Brasil. Não quis mais. Tive até proposta. Mas naquela época, e continua sendo, um grande problema para os treinadores no Brasil é que não existe projeto. O projeto é a vitória, é ganhar na quarta e domingo”, criticou.
“Não ficou mágoa nenhuma. O Cruzeiro é maravilhoso. Já conhecia o clube, porque na época da Copa de 1982 a gente já tinha ficado na Toca da Raposa I. Então eu já conhecia a estrutura do clube, que é fantástica”, disse. “Não me coloco como campeão da Libertadores. Apesar de o (Paulo) Autuori, que me substituiu, ter me feito uma homenagem, ter me citado depois da conquista, disputei um jogo apensas. Mas foi muito bom. Não tenho mágoa, tenho orgulho, e prazer de ter trabalhado lá”, finalizou.
Ricardinho, Nonato e Célio Lúcio recordam reação do Cruzeiro na Libertadores'1997
Falta de projeto nos clubes brasileiros
Oscar ainda fez questão de dar sua opinião sobre como deveria ser a relação entre clube e treinador. “Agora, já mais amadurecido, posso dizer que para contratar um técnico, tem que ter um projeto. Tem que saber quem é ele, o que ele pensa. Não estou dizendo em relação ao Cruzeiro, mas ao futebol brasileiro de forma geral. Tem que ter mais coerência. A pessoa que contrata fica numa boa, e o erro maior é dela, de quem contrata.”
Bernardi é mineiro de Monte Sião, no Sul do estado. Além de ter brilhado na Seleção, foi ídolo do São Paulo, onde foi campeão brasileiro em 1986 e paulista em 1980, 1981 e 1985. Ainda jogou na Ponte Preta, no Cosmos (dos Estados Unidos) e no Nissan (Japão).
Curiosidade
A curiosidade é que, na preliminar daquela partida de estreia pela Copa Libertadores, contra o Grêmio, o Cruzeiro empatou com o Villa Nova, por 4 a 4, pela primeira fase do Campeonato Mineiro. Foi o quarto jogo do time celeste no torneio estadual. Naquele ano, o elenco celeste foi dividido em dois. Enquanto os titulares disputavam a Libertadores, o chamado “Expressinho” ficava com o Estadual, que acabou sendo vencido pela Raposa.
Colaborou: Bruno Furtado
Veja as fichas dos dois jogos, disputados no mesmo dia:
CRUZEIRO 4 x 4 VILLA NOVA
Cruzeiro
Harlei; Marcos Teixeira, Gelson, Cléber Lima e Alex Carvaline (Alexandre); Dante (Maguinho), Reginaldo, Macalé e Alex Mineiro; Tico (Dé) e Donizete Amorim
Técnico: Wantuil Rodrigues
Villa Nova
Cláudio; Wilson Mineiro, Geovani, Eleomar e Wander; Alemão, André, Cao Baiano e Guiba; Marquinhos (Macaé) e Milton
Técnico: Luciano Pascoal
Data: 19 de fevereiro 1997 (quarta-feira)
Motivo: Campeonato Mineiro (4ª rodada da 1ª fase)
Local: Mineirão
Árbitro: Lincoln Afonso Bicalho
Assistentes: Marco Antônio Machado e Euller Nascimento
Gols: Guiba (cobrando falta), aos 39’ do 1º tempo; Alex Mineiro, aos 4’, Dé, aos 23’e aos 25’; Milton, aos 29’; Guiba aos 31’; Alex Mineiro, aos 33’, e Guiba, aos 41’ do 2º
CRUZEIRO 1 x 2 GRÊMIO
Cruzeiro
Dida; Vitor, Célio Lúcio, Rogério e Nonato; Fabinho, Donizete, Cleison (Elivelton) e Palhinha; Reinaldo (Da Silva) e Ailton
Técnico: Oscar Bernardi
Grêmio
Danrlei; Arce, Rivarola, Mauro Galvão e Roger; Dinho, Goiano, Emerson (Dauri) e Carlos Miguel; Paulo Nunes (Paulo Henrique) e Zé Alcino (Otacílio)
Técnico: Evaristo de Macedo
Data: 19 de fevereiro de 1997 (quarta-feira)
Motivo: Copa Libertadores (1ª rodada)
Local: Mineirão
Árbitro: Dacildo Mourão (CE)
Assistentes: Jorge Oliveira (DF) e Ednilson Corona (SP)
Público geral: 33.425 pagantes
Renda: R$ 176.640
Gols: Zé Alcino, aos 10’, e Ailton, aos 24’ do 1º tempo; Emerson, aos 18’ do 2º