Ter disputado o maior clássico mineiro uma única vez já seria motivo de orgulho para qualquer jogador profissional. Mas fazer história e conquistar títulos em cima do rival por ambos os lados não é para qualquer um. Por isso, o ex-lateral-direito Nelinho e o ex-zagueiro e ex-treinador Procópio são privilegiados. Eles atuaram bem com as duas camisas e têm os nomes cravados nas histórias de Atlético e Cruzeiro.
O Estado de Minas/Superesportes reuniu os craques para um bate-papo em que relembraram grandes clássicos, as passagens pelos dois clubes, o amor e o ódio das torcidas. A conclusão é que poucos duelos são tão importantes no futebol quanto Atlético x Cruzeiro, que chega à sua edição 500, segundo dados alvinegros.
“Tive o privilégio de jogar outros clássicos importantes pelo Brasil, como São Paulo x Corinthians, São Paulo x Palmeiras, Palmeiras x Corinthians, Flamengo x Fluminense, Internacional x Grêmio (como treinador), mas considero Atlético x Cruzeiro o melhor. E não é porque eu sou mineiro, mas é que foi o que mais me emocionou, mais me preocupou e mais deu alegrias. Ganhar um jogo desses é muito importante para você, para sua carreira, para sua equipe, para seus amigos, para poder sair em Belo Horizonte”, atesta Procópio, que adicionou o sobrenome Cardoso quando deixou de ser zagueiro com passagem pelos dois rivais e outros grandes clubes brasileiros e passou a treinador.
A importância de se sair bem em um confronto assim é reforçado por Nelinho. “Todo clássico é importante para o jogador. Ali, você pode encerrar sua carreira. E também ser alçado a outro patamar, chegar a uma Seleção Brasileira, se transferir para o exterior. Então, tem de entrar concentrado mesmo. Além disso, o torcedor valoriza demais a vitória no clássico”, argumenta ele, que foi lateral-direito de Galo e Raposa, além do Grêmio e da Seleção Brasileira.
Os dois consideram não haver diferença entre atuar em um ou outro rival. Isso é possível, segundo ambos, porque sempre encararam tudo com o máximo de profissionalismo e respeito ao clube que defendiam. E criticam o cenário atual.
“Para se ter noção de como era a rivalidade antigamente, eu namorava a irmã do Willian, então zagueiro do Atlético. Na semana de clássico, eu não queria nem namorar, para não encontrar com ele, olhar a cara dele, que seria adversário. Era uma responsabilidade muito grande. Já quando era técnico, encontrava jogador meu sentado na mesma mesa do rival. Não há problema, mas é melhor respeitar o torcedor”, argumenta Procópio.
“Hoje, o que há é agressão, um jogador xingando o outro, como vimos por aí. Rivalidade é bom, mas tem de haver respeito acima de tudo.”
Já o ex-lateral-direito se sente incomodado quando um jogador provoca a torcida rival após marcar um gol. E também acredita que o clássico perdeu muito com o fim das torcidas divididas no Mineirão, prática comum quando era jogador.
“Pelo lado da beleza, acho que é importante termos torcidas divididas. Tenho três filhas atleticanas porque as levei ao Mineirão em três clássicos e coincidentemente, a torcida alvinegra deu show em todos. Aquilo influenciou. Quem viveu aquilo sente saudade. Mas a torcida organizada arrebentou o espetáculo, é muita confusão, muita briga. Antes, todos gritavam a mesma coisa de cada lado, hoje é tudo confuso. Perdeu-se muito da beleza do clássico”, declara.
RESPEITO
Eles atuaram juntos no Cruzeiro entre 1973 e 1974. Depois, Procópio foi treinador de Nelinho tanto no Cruzeiro quanto no Atlético, o que fez com que a relação deles ultrapassasse o círculo profissional.
“Nelinho é não só um dos maiores laterais-direitos que joguei e comandei, mas também uma liderança fenomenal. Nem precisava ser capitão para ter o respeito de todos”, elogia Procópio.
Outro ponto em comum entre eles é apontar a decisão do Campeonato Mineiro de 1977 como um dos capítulos mais bonitos da rivalidade em Minas. Nelinho defendia o Cruzeiro, que tinha Procópio como diretor e, nos bastidores, treinador.
“Nosso time estava em processo de mudança, sendo rearmado, e o Atlético tinha um timaço, era franco favorito. Eles ganharam o primeiro jogo (1 a 0) e já se proclamaram campeões. Mas vencemos o segundo jogo por 3 a 2, com três gols do Revétria. Antes do terceiro jogo, o Toninho Cerezo deu entrevista falando que enquanto ele, Paulo Isidoro e Reinaldo estivessem jogando, o Atlético não perderia para o Cruzeiro. Aquilo mexeu muito com a gente. Vencemos por 3 a 1, com Joãozinho arrebentando na prorrogação, e fomos campeões”, recorda Nelinho.
“A decisão de 1977 realmente marcou. Aquela declaração do Cerezo acabou servindo para a gente motivar os jogadores do Cruzeiro. Coloquei o jornal (com os dizeres do atleticano) nos quadros negros da Toca da Raposa e mexeu com os brios dos jogadores. Foi um dos ingredientes que levou o time a conquistar aquele título”, afirma Procópio, que havia sido chamado pelo então presidente cruzeirense Felício Brandi para ajudar a equipe, o que gerou descontentamento de Yustrich, técnico à época. “Ele não gostou, mas eu também não recuei. Falei que ele estava errando ao pedir aos pontas para marcar. Foi assim que ganhamos.”
Eles também lembram histórias pelo lado alvinegro. Nelinho conta que ficou abismado ao ouvir, na primeira vez que atuou ao lado de Éder, a torcida gritar o nome de ambos antes de uma falta e logo a seguir entoarem: “qualquer um, qualquer um, qualquer um”. “Aquilo foi incrível, totalmente no improviso.”
NELINHO E PROCÓPIO: os craques em números
Procópio pelo Atlético
9 clássicos
6 vitórias
1 empate
2 derrotas
0 gol marcado
Procópio pelo Cruzeiro
18 clássicos
7 vitórias
7 empates
4 derrotas
0 gols marcado
Nelinho pelo Atlético
27 clássicos
8 vitórias
13 empates
6 derrotas
3 gols marcados
Nelinho pelo Cruzeiro
37 clássicos
13 vitórias
9 empates
15 derrotas
3 gols marcados