
O corte do principal nome da Seleção Brasileira da Copa América, por causa de torção no tornozelo direito, parece ser apenas mais uma peça desajustada de um quebra-cabeça imaginário que nunca se completa. Neymar não consegue ser o jogador que se espera dele. Por uma série de fatores. Por influência de várias pessoas, inclusive das mais próximas a ele, que insistem em superprotegê-lo, em infantilizá-lo, em tirar dos ombros dele a responsabilidade que tem não só como jogador de expressão e ídolo de milhares de pessoas, mas, sobretudo, como homem.
O episódio da acusação de estupro ilustra bem isso. E de quebra mostra que vivemos em um ambiente de machismo institucionalizado. Sem entrar especificamente no mérito da questão criminal – até porque ela ainda está em processo de investigação –, há um roteiro preconcebido rodando por aí do “pobre menino rico enganado por uma moça aproveitadora”. Veredictos dados com a convicção de quem testemunhou cada minuto da narrativa, inclusive tendo estado dentro do quarto daquele hotel em Paris. Vivemos numa era em que as pessoas sentem uma necessidade quase fisiológica de julgar instantaneamente o que nem sequer viram. Só ouviram falar.

Se voltarmos um pouco mais no tempo, veremos outros momentos conturbados na carreira do jogador, desde a rebeldia da época de Santos (inclusive a que rendeu a famosa citação de Renê Simões) até as negociatas feitas na ocasião da transferência para o Barcelona – transação que foi dissecada pela Justiça espanhola – e os rolos com a Receita Federal no Brasil. A ida para o PSG também não foi das mais serenas. Não é por acaso que ele não tem criado identidade por onde passa. Clubes e Seleção Brasileira. Falta um fio condutor a ligar o Neymar real ao jogador que a gente gostaria que ele fosse.
Ao mesmo tempo, a gente vê outro símbolo da Seleção Brasileira muito distante de toda essa badalação, de todo esse protecionismo, cumprindo a missão dela da melhor forma. Uma camisa 10 que faz jus à árdua caminhada que precisou percorrer para alcançar o sonho de ser jogadora de futebol. Que se dedica à equipe nacional de corpo e alma. Que, por tudo isso, merecia mais reconhecimento. Merecia dos deuses do futebol mais complacência até. Que merecia uma conquista expressiva, como medalha olímpica ou título mundial, para coroar tudo o que ela significa para o futebol.
Hoje, mais uma Copa do Mundo de Futebol Feminino se inicia. Será mais uma tentativa de Marta para subir ao degrau mais alto do pódio. Ela não precisa de troféus para atestar sua relevância para o esporte mundial. Mas merecia. A Seleção Brasileira tem, sim, uma camisa 10 bem representada. Tem craque. Tem um exemplo para milhares de meninas que sonham em invadir esse espaço ainda masculino. Precisamos falar mais de Marta. Simplesmente porque ela merece.