“O Atlético é um time de honra”, me disse certa vez o Kalil. Um time de honra não chuta cachorro morto, tampouco atesta sua morte. Um time de honra não ganha de véspera. Respeita. Quem poderia saber mais sobre isso do que o atleticano conhecedor da sua própria história?
Polícia Civil não ganha jogo, mandados de busca e apreensão não garantem um ataque efetivo, advogados e medidas judiciais não compõem uma defesa segura. Torcedor não empurra menos o seu time porque seus dirigentes são picaretas. Fosse assim, o que teria sido de nós mesmos? Torcedor não deixa de ir ao estádio porque o time não tem mais crédito na praça. Ele aumenta a aposta, a gente sabe bem sobre isso.
Com os vazamentos do InterCEC, suspeita-se que o Cruzeiro seja muito mais do que um clube de futebol e de vôlei – seria também uma quadrilha. Por algum motivo insondável, o Atlético, com um time pior, com um treinador muito menos experiente, com um banco sofrível, jogando fora, achou que tava tudo no papo porque a casa do outro caiu e sua diretoria era na verdade uma ORCRIM.
Meus amigos, eles ganharam tudo sob a gestão dos Perrella, o Vasco ganhou com Eurico Miranda, o Bangu era maior com Castor de Andrade, o Brasil venceu com Ricardo Teixeira, os dólares mais suspeitos do mundo irrigam a Champions League.
Apesar de tudo e ainda bem, um jogo de futebol ainda se decide dentro do campo. Onze contra onze, além dos dois bancos e dos dois treinadores. E o que vi na quinta-feira – até onde vi, porque ninguém é obrigado a produzir prova contra si próprio, de forma que me abstive portanto de confirmar a mim mesmo minha condição de completo idiota – foi um baile. Um baile diferente.
Digamos que foi um baile em que parecíamos impressionar, e assim irrompemos a pista como o John Travolta que vai pegar a Olivia Newton-John. Aí surge o herói improvável – aquele bolha da oitava série C, o sex appeal do Rodrigo Maia – e cráu. Seguimos na nossa toada, agregamos o moon walk, afinal, o que era aquele tergal mal-enjambrado perto da nossa boca de sino?
Então o Botafogo, digo, o Rodrigo Maia foi abrindo sua caixa de ferramentas. Correu com o Rocky Balboa, treinou com o mestre do Karatê Kid. Agora desliza sobre o tablado como uma bailarina do Faustão. E a gente lá, com a nossa gomalina vencida, bebendo sozinho no canto escuro do balcão. Foi feio, pessoal, foi horrível.
Se há algo de positivo, alguma lição a tirar, é a mesma do 6 a 1: time de honra não chuta cachorro morto nem ganha de véspera. Se há algo a que se apegar diante da nossa valsa fracassada, é que esse jogo agora se torna o exato contrário. A essa altura do campeonato, são eles que estão a bailar faceiros o seu cancã. E você sabe, há sempre uma boa chance de alguém reparar naquela pobre alma solitária, carcomida pela dor e pelo arrependimento.
Agora é nóis raiz, é nóis correndo atrás do prejuízo, é nóis por baixo da carne seca. Agora é nóis precisando de quatro pra tirar o Corinthians, é nóis vendo o Edcarlos se lançar à área no desespero final. Agora é nóis contra o Flamengo classificadaçado, é nóis subindo com o Leo Silva, é nóis puxando o pé daquele paraguaio. Agora é do jeito que a gente gosta e do jeito que a gente é, bailando o nosso pogo enlouquecido, nossos Galos de Porão.
Agora é nóis treinando no campo da Cemig, é a taça penhorada, é a sede indo a leilão, é o gol do Dinho. Agora é nóis e nossos cheques voadores, 40 mil no Mineirão contra o Náutico depois de uma eliminação, 50 mil de média na série B, 20 mil no Marrocos. Agora é nóis na série B, a gente cantando o hino contra o Vasco, e chorando, e amando o nosso Galo, e abraçando as nossas desgraças todas, porque um time de honra é muito mais do que um time de futebol, é um jeito de ver a vida, e de lutar, e de nunca desistir. Só não luta quem tá morto.
Agora é nóis subindo o sarrafo de todos os 2 a 0 que já viramos. Agora é nóis no ‘Eu acredito’, é nóis na Galoucura. Caiu no Horto, tá morto, é pau, é pedra, é o fim do caminho. Um time de honra, se tomasse de cinco, ainda ia achar que dava.
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O Bozo com a taça, jogadores, médico e aspones no picadeiro. Prevejo que esta será uma foto histórica. E não pela taça.