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Por que times como o Atlético se desajustam depois de um ano vitorioso?

Quantos times brilham numa temporada, ganham tudo e no ano seguinte parecem um aglomerado de interesses individuais?

Bob Faria, colunista do Superesportes, faz um paralelo entre bandas de música e times de futebol
foto: Bob Faria/Superesportes

Bob Faria, colunista do Superesportes, faz um paralelo entre bandas de música e times de futebol

Desde a adolescência, sempre toquei em bandas de rock. Comecei como baixista e fui caminhando. Nunca fui um músico brilhante, mas sempre toquei com talentos tão grandes que compensaram minhas limitações e me levaram ao extremo da minha capacidade. Dessa forma, sempre desfrutei de uma das coisas mais mágicas que pode acontecer com um ser humano, que é ter a sensação de pertencimento a um grupo, a um projeto, a uma busca.

Obviamente que há como fazer música sozinho, mas é muito mais divertido, enriquecedor e didático quando há outras pessoas envolvidas. Música é um esporte coletivo.

Quando alguém me pergunta como pode começar a tocar um instrumento, eu sempre digo: arranje alguém para tocar com você. Acerte e erre junto, misture os sons, preencha os espaços, anteveja a expressão do outro e assim você vai achar sua própria técnica e sua própria forma de falar através do instrumento.

Tocar numa banda é como pintar um quadro a várias mãos... Luz e sombra, sons e silêncio. É preencher com seu toque a frequência em que o outro deixou de soar. E, ao fim, entregar a quem ouve uma sensação de unidade, uma peça indissociável e bem maior que a soma de suas partes.

Quando as coisas não se encaixam numa banda, quem sofre é o público. A audiência média não sabe distinguir o que está acontecendo de errado. Não sabe se é o baixo que tocou as notas erradas, não sabe se a bateria está fora do tempo, se as guitarras estão com timbres ruins ou tocando acordes dissonantes.

Simplesmente a emoção da canção não é entregue... E o resultado é que o público não se conecta com o palco. A magia não acontece.

Pois num time de futebol, as coisas também são assim. Não à toa, se diz dos grandes times que eles jogam por música.

É também uma questão de ocupar espaços deixados pelo companheiro, conduzir o jogo como uma linha melódica bem afinada, antever o movimento do outro.

Baixar a intensidade quando necessário, atacar quando for o momento e coordenar os movimentos, para que as limitações se completem, preencher as lacunas e fazer o público achar que aquilo saiu naturalmente, que é fácil, dando a sensação que o todo é bem maior do que a soma das partes.

E por que, assim como as bandas e orquestras, os times de futebol também podem desafinar, se desajustar depois de terem mostrado capacidade para atuar juntos, como um bloco único?

Numa banda isso acontece quando alguém decide que é mais importante do que outro, ou que seu som deve soar mais alto, mais estridente ou mais longo do que o necessário.

Num time de futebol, também acontece isso. Quando alguém decide que é mais importante para o conjunto, que poderia resolver sozinho, que o apoio dos companheiros já não faria mais falta.

Acontece quando depois de muito esforço vem o sucesso e com ele a fogueira de vaidades e a sensação de que não é preciso mais se esforçar porque o caminho da vitória já foi descoberto.

Quantas bandas nasceram e se extinguiram em curtos períodos, deixando como legado somente uma ou duas canções e nunca mais foram ouvidas ?

Quantos times brilham numa temporada, ganham tudo e no ano seguinte parecem um aglomerado de interesses individuais, em vez de uma equipe puxando a corda para o mesmo lado? Qualquer semelhança com o Atlético não é mera coincidência.

Quando os Beatles, a banda que inventou o conceito de renascer, fazendo de cada álbum uma grande revolução sonora, estavam num beco sem saída, perdidos no estúdio, sem saber o que fazer, tocando mal, brigando e quase desistindo, eles recrutaram um quinto membro: o tecladista Billy Preston.

A simples presença de Billy nos estúdios colou de forma incrível um vaso que parecia quebrado definitivamente, e os Beatles tiveram seu ato final em grande estilo, fazendo seu último concerto como um ensaio aberto, no teto de um prédio e tirando dali dois álbuns que de novo mudaram o rumo da música mundial.

Às vezes é preciso aceitar olhares divergentes, permitir outras abordagens e sair da caverna para encontrar caminhos. Nem sempre blindar e esconder o jogo é a melhor solução.

A música, assim como o futebol, precisa do público. E ficar escondido, em muitas situações, em vez de ajudar a colocar luz sobre suas falhas, dá a falsa sensação de que é o mundo quem está errado.

 

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