Parceiros de Ronaldo no Cruzeiro em 1993 e 1994, os ex-jogadores Nonato, Roberto Gaúcho e Robson foram os convidados do episódio #14 do podcast Superesportes Entrevista. O trio contou histórias de bastidores inéditas do início da carreira do Fenômeno, hoje dono do clube que o revelou.
Sócio majoritário da SAF do Cruzeiro e disposto a fazer um 'choque de gestão' no clube, que tem dívida de R$ 1 bilhão, Ronaldo foi responsável, em 1993, por dar um 'desfalque' no almoxarifado celeste na Toca da Raposa. Junto do zagueiro Robson, seu companheiro de quarto, o então garoto de 16 anos 'fez desaparecer' do CT parte da coleção de material esportivo da Adidas da década de 1980.
"Na Toca da Raposa tinha um quarto, um almoxarifado de material esportivo. Os profissionais recebiam, e a gente (Robson e Ronaldo) não recebia material para treinar (chuteiras etc). Um dia, fuçando demais porque estávamos sozinhos na Toca, a gente abriu esse quarto e viu que era um depósito de material do Cruzeiro. Ah, a gente vendeu muito material. Ronaldo deu para todo mundo o material. A gente pegou tênis, roupa da Adidas muito antiga, bolsa... O Ronaldo levou para o Rio de Janeiro, muitos parentes ganharam o material do Cruzeiro. A gente vendeu o material e ganhou muito dinheiro", revelou Robson, 28 anos depois.
Capitão do Cruzeiro à época, Nonato lembrou do caso e de suas consequências para as duas promessas da base: "Eu tive notícia disso. A gente sempre ficava sabendo das coisas lá. O Benecy (Queiroz, supervisor) deu umas duras, uns puxões de orelha. O material era da Adidas, e a gente já usava Finta (em 1993). Esse material estava guardado desde 1989. Quando cheguei ao Cruzeiro, em 1990, já era Finta. E isso foi em 1993. Os caras não perdoaram, levaram tudo (risos)".
Mas não parou por aí. Robson lembrou que Ronaldo entrava com frequência na sala destinada à comissão técnica para fazer ligações de graça para o Rio. Como não existia telefonia celular, esse era o jeito que ele encontrava para matar a saudade do pais Nélio e Sônia. "A gente então foi ao Shopping Del Rey, compramos aparelho de telefone residencial e plugamos na tomada. Rapaz, o Ronaldo ligava todos os dias. Eu sei que a conta, meu amigo, chegou lá no Barro Preto".
Caneta em Luizinho e a 'redoma' de Paulo Roberto
O trio também contou ótimas histórias de Ronaldo em ação nos gramados, seja em BH ou nas excursões a Portugal e Japão. Como a treta com o zagueiro e craque Luizinho em um dos primeiros treinos do jovem atacante contra os profissionais do Cruzeiro. Bastou uma caneta para o 'tempo fechar' na Toca.
"O Ronaldo deu caneta nele de costas. Tocaram a bola no Ronaldo, ele pisou, deu a caneta de costas e passou para o outro lado. O Luizinho queria bater nele. Tivemos que pedir calma. Falamos: 'Deixa o menino driblar'. O Luizinho falou: 'Aqui, não. Aqui ele não vai fazer gracinha não'. Juvenil, moleque, isso foi o de menos que ele xingou. Até acalmar o Luizinho, demorou", contou Nonato ao Superesportes.
Quando veio a fama, Ronaldo passou a receber atenção especial na Toca. Em meio à resenha, Robson alfinetou o lateral-direito Paulo Roberto Costa, um dos líderes do grupo, por paparicar demais aquele que seria eleito três vezes o melhor do mundo.
"O Paulo Roberto era o único que não deixava ninguém sair com o Ronaldo. 'Vamos aqui, vamos ali'. Até o Roberto (Gaúcho) ficava de fora às vezes (dos rolés do Ronaldo). Ele gostava muito do Roberto, mas o Paulo Roberto não deixava ninguém chegar perto do Ronaldo, colocava uma redoma de vidro no menino. Mas por quê? Porque ele queria aparecer mais que o Ronaldo, entendeu?", afirmou o ex-zagueiro.
O primeiro carro de Ronaldo, a detenção numa blitz por falta de habilitação, os primeiros romances - com susto e injeção - e uma noite do Fenômeno como voyeur sobre um pé de carambola na Toca também são casos detalhados pelos amigos nesta entrevista.
Assista à entrevista com Nonato, Roberto Gaúcho e Robson sobre Ronaldo:
Assista à entrevista com Nonato, Roberto Gaúcho e Robson sobre Ronaldo:
Sobre o pé de carambola
Robson conta a história:
"Tinha um jogador que ajudou muita gente e que era muito namorador, bonitão, e estava naquela fase boa. Ele falou pra mim e pro Ronaldo: quando eu estiver chegando na Toca (com a menina), vou avisar vocês. Tinha um pé de carambola no estacionamento, e a gente subiu para ficar vendo ele namorar (dentro do carro). Não dava para ver a gente porque estava de noite. Rapaz, ele não acabava, ficou mais de meia hora, uma hora, e o Ronaldo em cima do pé de carambola olhando pra baixo, começou a dar cãibra. Foi uma situação muito engraçada".
Fotos do menino Ronaldo no Cruzeiro
Caneta em Luizinho
Nonato conta a história:
"Sem dúvida nenhuma que dava para perceber (a diferença de qualidade dele para outros atacantes), que o diga o nosso Luizinho (zagueiro do Cruzeiro entre 1992 e 1994). (Num dos primeiros treinos) o Ronaldo deu caneta nele de costas. Tocaram a bola no Ronaldo, ele pisou, deu a caneta de costas e passou para o outro lado. O Luizinho queria bater nele. Tivemos que pedir calma. Falamos: 'Deixa o menino driblar'. O Luizinho falou: 'Aqui, não, aqui ele não vai fazer gracinha não'. Juvenil, moleque, isso foi o de menos que ele xingou. Até acalmar o Luizinho, demorou".
Almoxarifado
Robson conta a história:
"Na Toca da Raposa tinha um quarto, um almoxarifado de material esportivo. Os profissionais recebiam, e a gente (Robson e Ronaldo) não recebia material. Um dia, fuçando demais porque estávamos sozinhos na Toca, a gente abriu esse quarto e viu que era um depósito de material do Cruzeiro. Ah, a gente vendeu muito material. Ronaldo deu para todo mundo o material. A gente pegou tênis, roupa da Adidas muito antiga, bolsa... O Ronaldo levou para o Rio de Janeiro, muitos parentes ganharam o material do Cruzeiro. A gente vendeu o material e ganhou muito dinheiro".
Capitão do Cruzeiro à época, Nonato lembrou do caso:
"Eu tive notícia disso. A gente sempre ficava sabendo das coisas lá. O Benecy (Queiroz, supervisor) deu umas duras, uns puxões de orelha. O material era da Adidas e a gente já usava Finta (em 1993). Esse material estava guardado desde 1988. Quando cheguei ao Cruzeiro, em 1990, já era Finta. E isso foi em 1993. Os caras não perdoaram, levaram tudo (risos)".
Robson lembra das broncas de Benecy Queiroz
"Toda vez que a gente ia para a concentração, todo mundo tinha um material de treinamento, e a gente não tinha. A gente não podia usar o material que a gente roubou, que a gente pegou, né? Aí, o Nonato pedia material pra gente, bolsa para viajar. E ele virou pro canto, e o Benecy falou: 'Já falei para vocês dois, já falei que para vocês nem comprando. Não me pede (material) mais não!". Só que o Nonato sempre dizia: 'Que isso, Benecy! Os meninos precisam de material. Aí ele deu short, umas camisas velhas, usadas".
DDD para o Rio
Robson conta a história:
"A sala grande da Toca da Raposa I era do treinador. Um dia, o Ronaldo conseguiu abrir aquela sala. A gente via que o treinador ficava no telefone direto. A gente então foi ao Shopping Del Rey, compramos aparelho de telefone residencial e plugamos na tomada. Rapaz, o Ronaldo ligava todos os dias para o Rio de Janeiro. Eu sei que a conta, meu amigo, chegou lá no Barro Preto, uma conta altíssima, e ninguém sabia de onde vinha".
Ronaldo nos times do Cruzeiro de 1993 e 1994
Da Toca para o primeiro apartamento
Robson conta a história:
"Roberto (Gaúcho), Paulo Roberto (Costa), Catê, Cleison começaram a levar o Ronaldo pra sair. Pronto, aí o menino desandou, não queria mais ficar na Toca, ficar vigiado. Aí ele falou com o César (Masci, presidente), que queria ter um apartamento. "Não, mas você está muito novo". Não teve jeito. Aí arrumaram um flat pra ele morar (no Barro Preto). Daí em diante, acabou. O Ronaldo conheceu a vida de Belo Horizonte com os meninos aí.
Primeiro carro de Ronaldo e flagra na blitz
Nonato conta que ensinou Ronaldo a dirigir na Toca:
"Participei só da parte lá dentro da Toca. Eu tinha dois carros: um Tempra (Fiat) e um Gol, um Golzinho normal. E quando eu ia para a concentração, ia mais no Gol. Depois da janta, a gente ia para o passeio das escadinhas na Toca, ficava lá batendo papo. E ele (Ronaldo) vinha: 'Bora dar uma voltinha de carro?'. Eu ficava ali na Toca, dando volta, até que ele pediu para dirigir sozinho. Só falei que não podia ir para o meio da rua, fora da Toca. Mas teve aquele Churrascão do Cruzeiro, e ninguém ganhou o Gol azul (em sorteio). E o presidente da época, o César Masci, deu o carro de presente para o Ronaldo. Dali, ele começou a andar sem carteira na rua, mas até ser pego (em blitz). Todo mundo sabia que ele era menor, e os dirigentes tiveram que dar um jeito para ele se safar".
Robson dá mais detalhes da blitz:
"Eu tinha carteira e não tinha carro. O Ronaldo tinha carro e não tinha carteira. Nesse dia, ele já estava morando em um flat no Barro Preto, não estava mais morando na Toca. Em frente à sede da Usiminas (na Avenida Carlos Luz), eles pararam o Ronaldo, perguntaram se tinha carteira, documento, e ele não tinha nada. Ele só queria andar, não sabia do documento que ele precisava também não. Batia asa pra baixo e pra cima. Depois, o pessoal do Cruzeiro ajudou para que ele tirasse a carteira. O Ronaldo foi muito ajudado, tenho certeza que ele ficou muito grato, e hoje está aí, essa fera toda".
Injeção para curar uma noite de amor
Roberto Gaúcho conta a história:
"O Ronaldo saiu poucas vezes comigo e com o Paulo (Roberto Costa, lateral-direito). Eu não levava ele para a noite, só saía para jantar no Galeto Itália. Ele gostava de sair para jantar, tomar guaraná e comer picanha".
Só uma vez que arrumamos uma namoradinha pra ele que era estragadinha também, viu? O doutor Ronaldo (Nazaré) teve que dar uma injeção na bunda dele, porque ele apareceu com um negocinho. A menina passou alguma coisa pra ele (risos)".
Robson dá mais detalhes do susto de Ronaldo:
"Isso foi em saídas com Roberto Gaúcho e Paulo Roberto. Eles levavam ele porque ele era de fora, do Rio, estava despontando, mas era mais para ir a restaurantes. Apresentaram uma guriazinha para o Ronaldo, e ela não estava com a saúde muito boa. O Ronaldo teve que tomar umas injeções. Ele ficou preocupado com isso, mas é algo que acontece. Com aquela latinha, ele não pegava ninguém. Sempre chamei ele de dentuço, nunca o chamei de Ronaldo ou Fenômeno.
Do anonimato à fama: os paparicos
Robson alfineta Paulo Roberto Costa:
"Isso aí, sim. O Paulo Roberto (Costa, lateral-direito) era um. O Paulo Roberto encostava no primeiro jogador. Não é que era panela. Eu ficava mais do lado de Nonato, Luís Fernando, Careca, Luizinho e Douglas. E Roberto Gaúcho já era Paulo Roberto, outra turma. Não é que estava dividido. O Paulo Roberto era o único que não deixava ninguém sair com o Ronaldo. 'Vamos aqui, vamos ali'. Até o Roberto (Gaúcho) ficava de fora às vezes (dos rolés do Ronaldo). Ele gostava muito do Roberto, mas o Paulo Roberto não deixava ninguém chegar perto do Ronaldo, colocava uma redoma de vidro no menino. Mas por quê? Porque ele queria aparecer mais que o Ronaldo, entendeu? O Ronaldo, não, sempre foi humilde, sempre gostou das mesmas coisas, só que felizmente a fase melhorou, ele começou a ganhar dinheiro, as pessoas que costumavam andar com ele não deixavam mais ele andar comigo. O Paulo Roberto não deixava. Era só o Paulo Roberto!".
Roberto Gaúcho opina:
"Não, eu não tinha grupos. O Nonato sabe. Sempre falei com Nonato, Luizinho, Douglas, nunca fui para o lado de Renato (Gaúcho), Paulo Roberto, Boiadeiro. Eu era de todos e não interferia em nada. É que o Paulo Roberto queria estar com ele (Ronaldo), entendeu? Queria, sei lá, cada um tem uma cabeça, sabia que o menino ia estourar. Eu não sei se ele queria comprar o Ronaldo do César Masci antes de vender (para o PSV). A gente não sabe o que se passa. O Paulo Roberto já era mais velho, já via que o garoto ia virar grana, ia dar muito dinheiro, mas o Ronaldo era um menino muito humilde, se dava bem com todo mundo".
Robson lembra da amizade entre Ronaldo e Dida:
"Aí o Dida veio (do Vitória), e ele só saía com o Dida. O Dida jogou na Seleção com ele no profissional. Mas eles eram amigos desde os tempos de Cruzeiro. Moravam juntos no Barro Preto, num flat, e a amizade deles ficou mais forte ainda. O Ronaldo não deixava de sair com o Roberto, com o Nonato, e ele sempre foi a mesma pessoa. Queria ver o Ronaldo agora para lembrar essas histórias (risos)".
Nonato opina sobre os cuidados de todos com Ronaldo:
"O lance do Ronaldo era pelo fato de ele ser muito novo, jovem, e essa exposição dele. O homem só fazendo gol, fazendo gol, e nós, mais velhos, tivemos que amparar porque senão ia chegar gente toda hora: mulher, empresário etc. O Ronaldo e o Robson foram os dois primeiros a morar na Toca nesse pavilhão. Eu e o Paulo da Pinta (ambos contratados ao Pouso Alegre) fomos para o Cruzeiro em 1990 e moramos na Toquinha junto com os moleques. E o Ronaldo, juvenil, já morava lá (no prédio principal). Ele era um jovem, sabiam que ele tinha um grande futuro.
A gente ficava sempre assim: 'Olha ele aí, veja se ele chegou com alguém diferente'. Você sabe que o que mais tem é isso, é gente querer se aproximar de jogador que está famoso ou sabe que vai virar um Ronaldo, um Neymar, um Gabigol. O que tem nêgo querendo fazer as coisas para os caras...
Era uma iniciativa da gente, do César (Masci, presidente), do Benecy, mas toda hora chegavam na gente, os mais experientes: 'Tem que ficar de olho no Ronaldo, ele é muito novo ainda. Se virem ele fazendo algo errado, tem que chamar atenção'. E a gente sempre fazia isso, tanto que ele não saía sozinho. Ele ia fora da Toca com o Paulo Roberto, com o Roberto Gaúcho, com o Robson, eu mesmo o levava no shopping, pegava roupa com o dono da loja Ombongo. Já levei ele para almoçar em casa. Ficava controlando ele para não fazer nada de errado".