O técnico Mozart Santos confirmou ter pedido demissão do Cruzeiro depois do empate por 2 a 2 com o Londrina, na última sexta-feira, no Mineirão, pela 15ª rodada da Série B. O resultado manteve o time na zona de rebaixamento, em 18º, com 13 pontos.
Mozart não deu detalhes se houve uma conversa prévia com a diretoria, já que o clube não poderia contratar um terceiro técnico se optasse pelo desligamento sem justa causa. O treinador entendeu que o seu trabalho não trazia o resultado esperado e abriu caminho para outro profissional.
“Foi um pedido de demissão simples para que o clube pudesse contratar outro profissional e vida que segue”, resumiu, em entrevista ao Superesportes. O ex-comandante da Raposa garante que o seu sucessor herdará uma base bastante consolidada.
“Pode ter certeza que o treinador que chegar vai pegar um padrão de jogo legal (...). Os resultados viriam comigo, mas é óbvio e justo que se troque depois de nove jogos sem vencer. Não levo isso para o lado pessoal, e sim para o profissional. Mas tenho certeza que o time vai ter resultado, muito pela herança boa de desempenho que vai pegar”.
Técnicos do Cruzeiro na gestão de Sérgio Rodrigues
O cenário de momento mostra o Cruzeiro com mais de 50% de chance de ser rebaixado à Série C, segundo o Departamento de Matemática da UFMG. Contudo, Mozart confia que ainda é possível brigar pelo acesso. Para ele, basta ao novo técnico emplacar sequência de três ou quatro vitórias e mudar o astral do grupo. Vale lembrar que o Náutico, líder da segunda divisão, soma 30 pontos, e o Avaí, 4º, tem 26.
“Na Série B deste ano não existe nenhuma equipe que esteja praticando um grande futebol. Diferentemente do América, da Chapecoense e do próprio CSA, que praticavam um futebol bem melhor do que está sendo praticado hoje na Série B. Então é possível sim”.
No bate-papo com o Superesportes, Mozart lamentou o pouco tempo que teve para encontrar um padrão de jogo e negou que atrasos salariais e proibição de buscar reforços por causa de uma punição na Fifa tenham sido determinantes para um aproveitamento de apenas 33,33% em 13 jogos - duas vitórias, sete empates e quatro derrotas.
Entrevista com Mozart Santos
Por que o trabalho não deu certo?
“Eu tenho uma filosofia bem definida, mas nem sempre é possível aplicar em todos os clubes. Talvez eu tenha demorado para entender as características do meu elenco. Tanto é que na minha opinião, e sendo bem criterioso, tirando o jogo contra o Avaí (derrota por 3 a 0), que foi atípico, nós tivemos um desempenho melhor nos últimos jogos. Mas infelizmente quando não tem resultado positivo, fica difícil sustentar um trabalho. As próprias ideias acabam se fragilizando, porque você tem ideias de futebol, mas precisa atrelar a bons resultados. Infelizmente esses resultados não aconteceram. Vejo que a minha saída simplesmente se deu pela falta de resultados”.
“Dou o exemplo do jogo contra o Londrina. Na minha humilde opinião, fomos bem superiores ao adversário. Sou bem justo nas análises dos jogos, e quando o adversário é melhor que minha equipe, sou o primeiro a admitir. Mas nesse jogo, especificamente, fomos muito superiores. Criamos quatro ou cinco chances claras de gol, mas não fizemos. No fim das contas, o que vale é o resultado, principalmente na situação em que nos encontramos. O resultado final foi um 2 a 2. Infelizmente, os episódios da minha passagem não foram favoráveis. E prefiro resumir ao fator campo, pois não gosto de entrar em outros méritos que não fazem parte da minha competência. Os resultados não aconteceram, então é normal que tenha uma troca”.
Como foi o pedido de demissão?
“Foi um pedido de demissão simples para que o clube pudesse contratar outro profissional, e vida que segue”.
As mudanças constantes na escalação atrapalharam? Seja por lesão, suspensão ou escolha técnica...
“Quando você chega num clube, (o ideal) é encontrar os 11 titulares por desempenho e seguir com esses 11 num esquema definido. Durante a competição e os treinamentos, você coloca aquele que está em melhor momento. O cenário ideal é esse. Mas, infelizmente, não cheguei num cenário ideal, onde, na minha opinião, não havia um sistema de jogo definido.
Particularmente, gosto do 4-3-3 com um volante e dois meias, que é o sistema que predominantemente aplico nas minhas equipes. Mas, na minha visão, esse elenco não tinha característica para desenvolver esse sistema, daí tive que começar a fazer mudanças, muitas delas por necessidade física e outras por lesão e suspensão.
O 3-4-3 é um sistema que joguei por muito tempo na Itália como atleta e também me identifico como treinador. Com esse sistema talvez tivemos os melhores desempenhos. A vitória contra a Ponte Preta foi assim, o empate criando três ou quatro oportunidades boas contra o Vila Nova foi assim. O empate com o Londrina, criando situações de gols, foi assim. Então é isso.
Talvez em outro clube que for vou fazer tanta mudança? Espero que não precise, né?! Daí eu encontro o melhor sistema e uma equipe base para poder seguir. Infelizmente não cheguei em um cenário ideal, e as mudanças foram por necessidade”.
O que o próximo técnico do Cruzeiro pode esperar da equipe?
“Com toda a humildade do mundo, pode ter certeza que o treinador que chegar vai pegar um padrão de jogo legal. Os jogadores que passaram por mim nesses dois meses, com boas informações e entendimento de jogo... não tenho dúvidas disso. Os resultados viriam comigo, mas é óbvio e justo que se troque depois de nove jogos sem vencer. Não levo isso para o lado pessoal, e sim para o profissional. Mas tenho certeza que o time vai ter resultado, muito pela herança boa de desempenho que vai pegar”.
Em meio aos resultados ruins, você conseguiu recuperar alguns jogadores, como o meia Marcinho e o atacante Marcelo Moreno. Como foi esse trabalho?
“Não fiz mais que minha obrigação. Os jogadores eram funcionários do clube, uns com carreiras importantes, outros com desempenho recente importante, que é o caso do Marcinho, um dos melhores meias da Série B pelo Sampaio. O Marcelo tem uma carreira importante, é um cara que sempre fez gol. Eu simplesmente dei confiança a eles, e eles renderam. Simples assim. Foi um processo simples e natural, nada de muito mérito meu”.
Técnicos que passaram pelo Cruzeiro estão fazendo trabalhos melhores em outros clubes, casos de Felipe Conceição (Remo), Enderson Moreira (Botafogo) e Ney Franco (CSA). Na sua opinião, existe um fator além das quatro linhas que impedem o sucesso de profissionais na Toca?
Você falou de alguns nomes aí. Todos são bons treinadores. Às vezes a sua ideia funciona num determinado clube, às vezes funciona em outro clube. Acho isso natural. No futebol, muitas coisas demandam tempo, e o brasileiro culturalmente é imediatista. Falando de futebol, quer o resultado para ontem. Aqui dificilmente você vai ver um técnico trabalhar três quatro ou cinco anos seguidos em um mesmo clube.
Os clubes são geridos muitas vezes de fora para dentro, e eu entendo a pressão externa, embora não concorde, acho ela natural. Dificilmente você vai ver um bom treinador ter resultado em um clube que está atravessando um momento difícil, porque não vai ter tempo. Ele prefere jogar pelo resultado do que pelo desempenho. Pode ter certeza que o desempenho no médio a longo prazo vai trazer bons resultados, e no curto prazo, com um desempenho não tão bom, mas jogando por uma bola, vai alcançar um resultado imediato, mas sem construir nada.
Enquanto não houver essa mudança de mentalidade, os grandes clubes nos momentos de dificuldade vão patinar, é natural isso. Há coisas no futebol que demandam tempo, não é simplesmente pegar 11 camisas, jogar para cima, escalar e ganhar. Você pode ganhar o jogo, mas dificilmente terá desempenho para ganhar alguma coisa. Essa é a minha opinião. Mas é um cenário que nós vivemos, não dá para lamentar, é conviver com isso. É torcer para dar certo, mas sabendo que algumas vezes não vai dar”.
A imprensa também tem um papel importante nesse cenário, pois gosta da turbulência. Não é crítica, e sim uma constatação. A imprensa alimenta muito a questão da mudança de treinador, porque realmente vende. Por mais que ela critique uma possível troca de treinador, há uma mobilização muito grande dos meios de comunicação para especular quem vai ser, se vai sair. Enquanto não mudarmos isso, vamos continuar patinando. E é difícil pedir desempenho a um time que você chega na sexta, já joga no sábado, depois na terça e em dois meses você vai embora. É difícil conseguir resultado atrelado a desempenho na minha opinião”.
A impossibilidade de o Cruzeiro contratar por causa do transfer ban na Fifa atrapalhou o planejamento da sua comissão técnica em relação ao elenco?
“Seria leviano da minha parte dizer que foi determinante. Não gosto de transferir. É um elenco qualificado, óbvio que existe uma carga emocional grande para se jogar hoje por causa dos resultados. Outras coisas foram determinantes, não essa. Paciência, vida que segue”.
E os salários atrasados?
“Quando o cara entra em campo, nem pensa nisso. Mas é óbvio que no dia a dia os problemas batem à tua porta e atrapalham. Mas, na minha opinião, não influencia diretamente. Prefiro até me abster desse tema”.
Para encerrar, a diretoria mantém as esperanças de acesso, embora a classificação mostre o Cruzeiro na zona de rebaixamento, com metade da pontuação do Avaí, 4º colocado. No seu entendimento, ainda é possível subir à Série A?
“Na minha opinião é possível pensar em acesso sim. Vou explicar a minha resposta. Na Série B deste ano não existe nenhuma equipe que esteja praticando um grande futebol. Diferentemente do América, da Chapecoense e do próprio CSA, que praticavam um futebol bem melhor do que está sendo praticado hoje na Série B. Então é possível sim. Basta conseguir encaixar dois ou três resultados positivos, não oscilar em termos de desempenho e ir embora. Na minha opinião não tem nenhuma equipe superior no campeonato em termos de desempenho. Então é possível sim”.