O Superior Tribunal de Justiça Desportiva do Futebol (STJD) julgou, nesta quinta-feira, o recurso do suposto caso de injúria racial sofrida pelo meia Edenilson, do Atlético, quando ele atuava pelo Internacional. Absolvido em primeira instância pelo fato ocorrido no Campeonato Brasileiro de 2022, Rafael Ramos, do Corinthians, teve sua sentença reformulada pelos auditores do Pleno.
Segundo os auditores, houve "ofensa" no caso, não injúria racial (conforme já havia sido definido), o que gerou a punição de uma partida de suspensão e multa de R$ 20 mil com base no artigo 243-F do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD), por maioria de votos.
Procurado pela Gazeta Esportiva, o advogado Daniel Bialski, que representa o Corinthians e pediu a absolvição do lateral, explicou a situação.
"Absolveram da injúria racial, sendo que ele não praticou qualquer injúria, mas o condenaram por uma partida (de suspensão) pois ele teria ofendido o outro atleta com palavras de baixo calão. Mas a unanimidade absolveu da injúria racial, mantendo a decisão anterior", falou.
"Vamos recorrer, mas o principal é que se reconheceu, de novo, a unanimidade que ele não falou a palavra 'macaco' e não houve qualquer tipo de injúria racial. Inclusive, a Procuradoria pediu a absolvição do Rafael de tudo, nem foi desclassificação", complementou.
Outro ponto levantado pelo profissional é de que, caso a sentença seja cumprida, em diversos jogos futuros deverá haver vários procedimentos disciplinares contra vários atletas, "pois é uma coisa corriqueira do futebol" ("xingamentos de baixo calão").
Relembre o caso
O episódio envolvendo Rafael Ramos e Edenilson ocorreu na partida realizada no dia 14 de maio, válida pelo Brasileirão de 2022, no Beira Rio.
Aos 31 minutos do segundo tempo, Edenilson informou ao árbitro que o atleta adversário havia dito a ele as seguintes palavras: "fod*-se macaco".
Julgado em primeira instância, Rafael Ramos foi absolvido de forma unânime após os auditores da Segunda Comissão Disciplinar entenderem pela falta de elementos probatórios para sua condenação.
Como foi a audiência
Alegando haver discordância pelas partes e intervenientes quanto aos fatos ocorridos, a Procuradoria do STJD entrou com recurso, assim como o Internacional, solicitando uma nova análise sobre o caso denunciado no artigo 243-G do CBJD.
No artigo em questão, fala-se sobre "praticar ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica, raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência". A pena é de suspensão de cinco a dez partidas, além multa entre R$ 100 e R$ 100 mil.
Na sessão do Pleno desta quinta-feira, o relator José Perdiz de Jesus fez a leitura do processo, destacando os detalhes dos resultados das cinco perícias de leitura labial feitas, que divergiram sobre as palavras "car*..." e "macaco".
Em seguida, o advogado Rogério Pastl fez uso da palavra representando a defesa do Internacional, por meio de videoconferência.
"Não há nenhuma satisfação em sustentar um caso como este, uma história muito triste. A sociedade brasileira, a CBF e este Tribunal têm feito uma cruzada em relação a estes casos. Se antigamente podia-se dizer para um jogador dentro de campo palavras de aspas como viado e macado, hoje não é mais tolerado. A sociedade evoluiu e hoje não se permite mais chamar ninguém assim", iniciou.
"Há contradições das palavras ditas pelo senhor Rafael, que muda de versão várias vezes. Em relação ao laudo pericial, o que falta ser dito é que a Polícia do RS não tem capacidade de avaliar o que é dito dentro de um jogo de futebol, diferente do perito contratado por este Tribunal que concluiu muito bem a análise do que foi dito. Por isso, a defesa requer o provimento aos recursos", complementou.
Na sequência, o Procurador-geral Ronaldo Piacente manifestou sua opinião a respeito do recurso.
"(...) Então, se punirmos por algo que não aconteceu, seria uma injustiça. E, por outro lado, seria uma injustiça ainda maior punir sem ter essa certeza. Eu não consigo constatar realmente a certeza de que ele tenha falado a palavra macaco. Por isso, neste processo específico, estou opinando pela absolvição do atleta Rafael Ramos".
O advogado Daniel Bialski, representante do Corinthians, pediu novamente a absolvição do lateral Rafael Ramos, que acompanhou a sessão ao lado do defensor de forma online.
"(...) O que está se afirmando aqui é que Edenilson se enganou, não que ele mentiu. Rafael não tem qualquer mácula de comportamento dentro e fora de campo, é um atleta de conduta indiscutivelmente ilibada que nunca concordou com a denúncia. Se não existir prova cabal, ninguém pode ser condenado por qualquer tipo de ato. O que se pede é que seja negado o provimento aos recursos e mantido a absolvição", declarou a defesa.
Após as sustentações, o relator José Perdiz de Jesus solicitou explicações técnicas ao auditor Mauro Marcelo de Lima e Silva, especialista na área criminal, que esclareceu que a fala do atleta denunciado foi "mano, car*...".
Diante disso, o relator José Perdiz de Jesus sugeriu o recurso parcial da Procuradoria para desclassificar a conduta do atleta para o artigo 243-F, com a pena de suspensão de uma partida acrescida com multa de R$ 20 mil, "onde o clube poderá usar para fazer uma vasta campanha contra qualquer tipo de ato discriminatório, por exemplo".
Na sequência, o vice-presidente administrativo do STJD, Maurício Neves Fonseca, votou pela manutenção da absolvição do jogador do Corinthians.
O auditor Felipe Bevilacqua e o presidente Otávio Noronha acompanharam o voto do relator integralmente, enquanto os auditores Sérgio Leal Martinez e Jorge Ivo Amaral também entenderam pela desclassificação para o artigo 243-F, mas com a aplicação de duas partidas de suspensão além da multa de R$ 20 mil.