Está chegando a hora! Atlético está perto de soltar o grito de bicampeão da garganta (Foto: Pedro Souza/Atlético)

O atleticano se acostumou com a tragédia. Foi forjado em injustiças históricas, cresceu na inquietude de quem vivera o pior. Sofreu por Reinaldo, Cerezo, Marques, Guilherme, Ronaldinho, Victor, Éder, Leonardo Silva, Diego Tardelli e tantos outros a quem viu se eternizaram na galeria de ídolos, mas o fizeram sem alcançar a glória que tem o tamanho da espera de uma vida inteira. Chorou nas derrotas, enervou-se contra as arbitragens, os times rivais, o regulamento, a CBF, o próprio destino... Mas jamais se rendeu. Afinal, quem ama não abandona. E o amor sempre foi maior que uma angústia de cinco décadas, que está muito perto do fim. Nesta terça-feira, o Clube Atlético Mineiro pode, finalmente, ser bicampeão brasileiro.




Talvez não seja exatamente da forma como os alvinegros tanto imaginaram: com o time em campo e o Mineirão lotado. A épica jornada dos heróis de 2021 pode ser coroada de forma não usual, no sofá de casa. Mas quis o acaso que a glória pudesse ser conquistada com o tormento de quem tanto castigou grandes times da centenária história atleticana. A taça está a um tropeço do rival Flamengo, algoz da finalíssima nacional de 1980 e, claro, da Copa Libertadores do ano seguinte.



De alvinegro para alvinegro, o Ceará vai representar o sonho de milhões de torcedores que não vestirão as camisas de nenhum dos times que entrarão em campo no Maracanã, às 20h, pela 36ª rodada do Campeonato Brasileiro. Por capricho dos deuses do futebol, os caminhos do esporte podem fazer com que o segundo título atleticano seja conquistado no mesmíssimo lugar de 50 anos atrás.

Em 19 de dezembro de 1971, Dario testou para as redes o cruzamento perfeito de Humberto Ramos e deu ao Atlético aquela que era sua maior conquista em 63 anos de existência. A vitória por 1 a 0 sobre o Botafogo no Maracanã garantiu o título brasileiro. Os milhares que foram às ruas de uma crescente Belo Horizonte festejaram como nunca, mas mal sabiam os anos angustiantes que estavam por vir.




As mágicas equipes dos anos 1970 e 1980 foram punidas pelos rumos incompreensíveis da história. Na década de 1990, o time de Marques e Guilherme fez ressurgir a esperança, mas o desfecho foi o mesmo com o qual uma geração inteira havia se acostumado. Veio a mancha do descenso, no fatídico 2005. O esquadrão de 2013 e 2014 encantou e conquistou, mas não se livrou da sina.



Da cabeçada de Dadá até o canhotaço de Hulk contra o Fluminense, foram 1444 partidas, mais de dois mil gols marcados e derrotas emblemáticas. O título escapou entre os dedos com cinco vice-campeonatos (1977, 1980, 1999, 2012 e 2015). Em outras 12 campanhas, o time alcançou terceiro ou quarto lugares amargos. A espera parecia não ter fim. Mas, com a licença dos traiçoeiros e já mencionados deuses do futebol, terá.

"Pode acontecer na terça contra o Ceará? Pode. Mas pode não acontecer. Pode acontecer no outro jogo com o Sport? Pode. Pode acontecer com o Santos? Pode. Pode acontecer com o Atlético-GO? Pode. Conosco pode acontecer contra o Bahia? Pode. Pode acontecer aqui contra o Bragantino ou lá com o Grêmio na última (rodada). Em qualquer uma dessas situações, pode acontecer. Agora, a gente tem que fazer acontecer", afirmou Cuca, o técnico libertador de 2013 e que está a um passo de espantar mais um fantasma.






Acostumado a torcer contra o vento, o torcedor do Atlético seca o Flamengo para pôr um ponto final numa batalha de glórias e sofrimentos que perduram por cinco décadas.

Se não for nesta terça, serão mais seis oportunidades para um tropeço flamenguista ou de uma vitória atleticana até o fim do Brasileirão. A chance seguinte é o jogo contra o Bahia, na quinta-feira. O roteiro está quase pronto, à espera do ato final de um drama em preto e branco que terá um final feliz.