Richarlison foi o grande nome na estreia da Seleção Brasileira na Copa do Mundo no Catar ao marcar os dois gols da vitória sobre a Sérvia, na quinta-feira (24/11). Mas como tudo começou para o camisa 9 do Brasil? O Superesportes mostra, a seguir, os bastidores da chegada do atacante ao América, clube que o revelou.

O teste para integrar as categorias de base do Coelho surgiu por meio de uma ligação, em 2014 - quando o jovem tinha 17 anos e estava na base do Real Noroeste-ES. Ainda responsável por gerenciar a carreira do atleta, o empresário Renato Velasco entrou em contato com Geraldo Ventura, funcionário que cuidava das categorias de base do time.

Integrante do Conselho de Administração do América, Euler Araújo ocupava a mesma função naquela época e era um dos responsáveis pelo departamento de futebol. Em entrevista ao Superesportes, o dirigente detalhou o processo de captação de Richarlison.

"Seu Geraldo marcou o teste de imediato, e ele (Richarlison) foi para Santa Luzia (região metropolitana de Belo Horizonte) fazer. Fez e no segundo dia já foi solicitada a documentação dele para ele ficar no alojamento do América. Foram poucos dias de treino até ele ir para o time juvenil do América", contou.

Outro que teve participação direta na chegada do então jovem ao Lanna Drummond foi Cláudio Prates, auxiliar técnico do clube na ocasião. Ele revela que Régis Felisberto, ex-meia do Flamengo e treinador de Richarlison em uma escolinha de Nova Venécia-ES, já havia comentado sobre o garoto.

"A história dele é interessante, porque eu trabalhei no mundo Arábe, e eu joguei com um jogador de Nova Venécia (cidade natal de Richarlison), que é o Régis (ex-meia do Flamengo). Ele falou que estava vindo um menino fazer um teste. Nisso passou um tempo, e o Richarlison começou no Sub-20", disse.

Não demorou muito para Richarlison despertar atenções na base do América. Euler Araújo percebeu a estrela do jovem em uma partida no CT Lanna Drumond, no fim de 2014. Naquela circunstância, o Sub-17 do Coelho estava na reta final do Campeonato Mineiro da categoria, no qual levantou o troféu ao superar o Atlético na final.

"No Sub-17, o Richarlison me chamou muita atenção. Eu estava junto com o Cláudio Prates, auxiliar do Givanildo (Oliveira, técnico do América naquele ano). Conversei com o Cláudio e pedi para olhar o treino também, um jogo contra o Araxá. (Depois) o América foi jogar contra o Itabirito, e eu fui lá ver", iniciou.

"Ele me impressionou de novo. Eu voltei a falar com o Cláudio: 'Esse menino é diferente, temos que colocar ele para treinar quando tiver oportunidade'. O Cláudio olhou e falou que iria colocar ele para treinar no profissional quando tivesse oportunidade. Ele tinha acabado de subir para o Sub-20", relembrou o dirigente. 

O América disputou a Série B do Campeonato Brasileiro em 2015, ano em que Richarlison foi promovido ao profissional. A possibilidade do primeiro treino no time de cima surgiu com a 'precaução' do técnico Givanildo Oliveira.

Givanildo já havia visto Richarlison em ação em um amistoso do sub-20 do América contra o Betinense, em março. Ao consultar Cláudio Prates, ele quis saber a opinião do auxiliar sobre alguns atacantes de destaque na base, pois não estava contente com os desempenhos de Cristiano e Rubens.

O primeiro, que era titular, fez o gol da vitória sobre o CRB, no Independência, pela 7ª rodada da Série B, porém levou cartão vermelho no mesmo jogo e precisou cumprir suspensão diante do Atlético-GO, também no Horto.

"Foi nesse dia, estávamos treinando no campo do meio, e o Sub-20 em cima. Eu falei com ele, 'tem um menino muito valente e corajoso'. O Richarlison apanhava muito dos zagueiros, ia para cima. O que ele faz hoje com muita maestria fazia naquela época com muita coragem", comenta Cláudio.

"O professor gostou, 'se está falando isso, vou dar uma olhada'. Falei com ele, 'professor, acho que dá para trazer esse menino'. E foi isso que aconteceu. Quando o Richarlison desceu, era impressionante a vontade dele. Era muito tímido, tinha passado por outras peneiras e não tinha sido aprovado. Era uma pedra brilhante, e não deu outra", completa o ex-auxiliar do Coelho.

A estreia do Pombo em treinamentos do time de cima ocorreu em 18 de junho. Com personalidade, o garoto de 18 anos incomodou os zagueiros Wesley Matos e Anderson Conceição e obrigou o goleiro João Ricardo a fazer duas boas defesas, além de cabecear uma bola bem perto da trave esquerda.

"Quando ele treinou no segundo dia, o Cláudio ligou para mim e falou, 'eu quero ele no profissional'. Chamei o Renato Velasco (empresário do jogador) para fazer o contrato profissional, e fizemos um de cinco anos", conta Euler.

Richarlison repetiu o desempenho positivo em sua estreia como profissional, no dia 4 de julho, contra o Mogi Mirim. Após ser relacionado na partida anterior, o atacante saiu do banco de reservas com a camisa 22 aos 32 minutos do segundo tempo, entrando no lugar de Cristiano. Aos 43, ele marcou de cabeça o terceiro gol da vitória do Coelho por 3 a 1, no Independência, pela 10ª rodada. 

O Pombo se firmou ao lado de Toscano no ataque e não saiu mais do time que arrancou para o acesso à primeira divisão do Campeonato Brasileiro, na quarta posição, com 65 pontos (19 vitórias, oito empates e 11 derrotas). 

Os dois foram responsáveis por quase 42% dos 55 gols do América na Série B. Richarlison marcou nove em 24 jogos. Toscano fez 14 em 35 partidas.

Com a boa temporada, surgiu a proposta do Fluminense em dezembro: R$ 10 milhões por 50% dos direitos econômicos do jogador (o América detinha 70%). Precisando fazer caixa e com a possibilidade de colocar o jovem em uma grande vitrine do futebol brasileiro, o Coelho assinou a transação e ainda manteve 20% de participação em uma negociação futura.

"Era muito dinheiro naquela época. Nós estávamos em uma situação, com uma dívida de mais de R$ 5 milhões. Aparece ela (a venda), nós pagamos salário, 13º, premiação, e começamos o ano com R$ 6 milhões em caixa. Conseguimos equalizar um tanto de dívida", explica Euler.

Em seu primeiro ano no Fluminense, Richarlison teve números modestos: quatro gols em 31 jogos. Na segunda temporada, em 2017, destacou-se no Campeonato Carioca, com oito gols em 12 partidas, e no Brasileiro, ao balançar a rede cinco vezes em 14 rodadas.

Em julho de 2017, o Tricolor vendeu o atleta ao Watford, da Inglaterra, por quase 12,5 milhões de euros, o equivalente a R$ 46 milhões na época. Nessa operação, o Coelho teve direito a mais de R$ 9 milhões.

O atacante permaneceu no Watford até julho de 2018, quando foi comprado pelo Everton, também da Inglaterra, por 39,2 milhões de euros (mais de R$ 176 milhões na época). Foram quatro temporadas de muito sucesso, com 53 gols e 13 assistências em 153 jogos. 

Nesse intervalo, Richarlison ganhou o apelido "Pombo", passou a ser convocado pelo técnico Tite para a Seleção Brasileira e representou o país no torneio de futebol dos Jogos Olímpicos de Tóquio (2021), do qual foi artilheiro, com cinco gols, e medalhista de ouro. Por fim, em julho de 2022, trocou o Everton pelo 'vizinho' Tottenham por 50 milhões de libras - R$ 327 milhões na cotação atual.

Com participações efetivas no surgimento de Richarlison no time principal do América, Euler Araújo e Cláudio Prates celebram o momento positivo do jogador e esperam que ele dê sequência ao bom desempenho.

"Não dá para descrever (o sentimento de ver Richarlison marcando). Eu sempre disse duas coisas sobre o Richarlison, já falei com ele: 'Você tem duas coisas impressionantes, uma é seu foco, é impressionante, e a humildade que ele tem é absurda, e esse cara é predestinado", destacou Euler.

"Esse rapaz é predestinado, merece tudo que está acontecendo na vida dele. Me perguntaram, 'depois do Ronaldo, ele é o camisa 9 da Seleção?'. Eu falei, não tenho dúvidas. Tentamos outros, mas é ele. Tudo que está acontecendo na vida dele é porque merece, trabalhador. É uma alegria absurda, de ver um menino chegar aqui (em Belo Horizonte), sem dinheiro para voltar, e o América acolher. O mérito não é meu, mas de todos", completou o dirigente.

"Eu fico muito feliz e orgulhoso de ter passado esse período com ele e ver onde chegou, por mérito total dele. Era um cara extremamente competitivo, não tínhamos dúvida da entrega e da doação. Muito cativante, cativou os experientes do plantel. Nesta fase da Copa, todos postam foto com ele. (...) Era um cara que queria muito isso, e graças a Deus, fico muito feliz de ver ele brilhando. Vai conseguir esse hexa e ter o destaque que teve nesse jogo", comemorou.

 

América e Richarlison sempre interagem entre si nas redes sociais. Clube formador do atacante, o Coelho comemorou a convocação e os gols do Pombo na estreia da Copa.

Richarlison é candidato a protagonista na sequência da Copa do Mundo, em que o Brasil tentará buscar uma vaga nas oitavas de final diante de Suíça - segunda-feira, 28/11, às 13h de Brasília - e Camarões - sexta-feira, 2/12, às 16h -, pelo Grupo G. Em meio à ausência de Neymar, que sofreu uma entorse no tornozelo direito, o camisa 9 terá responsabilidade maior no ataque brasileiro.