A viagem de quase 40 horas começou pelo menos 14 dias antes do embarque. O rígido protocolo estabelecido pela organização dos Jogos Olímpicos e o medo - do vírus e da possibilidade de ser privado de um sonho - me fizeram intensificar o isolamento social, companheiro quase inseparável desde o início da pandemia.
Foram duas semanas que acabaram com a bateria do termômetro. Não se tratava exatamente de características hipocondríacas de alguém que já não saía de casa. Era mesmo a necessidade de monitorar a própria saúde antes de rumar ao outro lado do planeta. Antes do primeiro voo, ainda foi preciso passar por dois exames de COVID-19.
O protocolo será mesmo ser uma das grandes estrelas da primeira Olimpíada realizada durante uma pandemia. A lista exaustiva - mas necessária - de documentos exigida pelo Japão foi cobrada pelo menos cinco vezes antes mesmo da chegada ao país. Aqui, o processo burocrático e sanitário até sair do aeroporto durou 3h40. Nada mal para quem havia ficado mais de 30 horas entre Belo Horizonte, São Paulo, Paris e, enfim, a capital japonesa.
As centenas de páginas - centenas! - que detalham as normas anti-coronavírus durante a Olimpíada já previam um processo mais demorado que o usual. Entre cinco ou seis filas, foi preciso conferir seguidas vezes a documentação, ativar um aplicativo que monitora a saúde de todos os envolvidos no evento, realizar mais um teste de COVID-19 e passar pelos trâmites tradicionais de imigração e conferência de bagagem.
Cada passo está sendo monitorado. E as restrições não param por aí. No hotel, aprovado pelo comitê organizador, novas regras são impostas. Durante as 24 horas do dia, um vigilante fica na entrada da acomodação para evitar que os recém-chegados saiam e quebrem o protocolo.
Ao fim da quarentena de três dias (marcada por testes diários), algumas limitações continuam. Apenas locais oficiais de competições ou treinamentos podem ser visitados ao longo das duas primeiras semanas. O transporte público é proibido nesse período.
No hotel, há também a orientação de chegar ao quarto apenas pelas escadas para evitar contato com outros hóspedes. A necessária rigidez nos protocolos, porém, impõe alguns desafios. Enquanto escrevo este texto, ainda não sei exatamente como conseguir comida. Os administradores do hotel me explicaram que, pelo protocolo, não podem me servir no quarto. E, tecnicamente, eu não posso sair daqui.