No capacete, as faixas verticais em verde, amarelo, azul e branco fazem lembrar o design eternizado por um ídolo nacional. Ao estilo Ayrton Senna, o inglês Lewis Hamilton busca inspiração no brasileiro para brilhar mais uma vez no país onde não nasceu, mas o qual chama de "lar". "Eu cheguei aqui e tenho um amor e uma afeição por este lugar. Então, eu sinto que é como minha casa. É um lugar onde eu quero passar mais tempo", declarou o heptacampeão da Fórmula 1. Penalizado, precisa de uma corrida de recuperação para seguir na luta por mais um título, agora contra o holandês Max Verstappen. Afinal, vai largar longe das primeiras posições no Grande Prêmio de São Paulo, no Autódromo José Carlos Pace, em Interlagos, às 14h deste domingo (14).

Hamilton fez uma bela prova classificatória nesse sábado, quando saiu do fundo do grid por ter sido penalizado em função de uma infração técnica na asa traseira, ganhou 15 lugares nas 24 voltas e terminou em quinto. Por trocar o motor de combustão interna da unidade de potência, vai largar cinco posições abaixo neste domingo. Enquanto isso, Verstappen começa na primeira fila: será o segundo, atrás apenas do finlandês Valtteri Bottas. Líder do campeonato de pilotos, o holandês tem 21 pontos à frente do inglês, em uma das disputas - dentro e fora das pistas - mais acirradas e tensas dos últimos anos.

"Acho que todo ano é empolgante, mas sempre diferente dos outros. Você está em um momento diferente da vida a cada ano, está se sentindo diferente, passando por coisas diferentes. Nos últimos dois anos, passamos por esta pandemia - e ainda estamos nela, com cepas diferentes... Nós estamos trabalhando duro para alcançar nossos sonhos e objetivos. Esta certamente é uma das temporadas mais empolgantes em termos de competitividade e das equipes contra as quais estamos lutando. Isso faz com que mais olhares estejam direcionados ao esporte, o que é ótimo. Nós estamos em uma batalha muito acirrada contra outra equipe muito, muito forte (RBR)", destacou o piloto da Mercedes.

Há 13 anos, o inglês protagonizou um dos momentos mais marcantes da história da F1 justamente no Brasil. Em 2008, o brasileiro Felipe Massa venceu a prova de forma brilhante. Quando cruzou a linha de chegada, estava sendo campeão. Mas o ainda jovem Hamilton, 23, tinha um último suspiro. Na volta final, suou para ultrapassar o alemão Timo Glock e alcançar o quinto lugar - colocação limite para ficar com o primeiro título mundial. Era uma conquista para coroar o início de carreira do promissor piloto, que já começava a construir uma relação de amor com o país que admirava desde a infância.

"Eu me lembro da primeira vez que vim ao Brasil. Eu cresci vendo e jogando futebol no videogame, sempre com o Brasil. Eu amava o amarelo e o verde do uniforme - é muito parecido com o meu capacete de corrida. Mas eu nunca havia estado no Brasil. Quando vim aqui pela primeira vez, eu me lembro de me sentir muito emotivo. Voltar a cada ano, crescendo com os fãs brasileiros, entendendo mais e mais sobre a beleza do Brasil...", relembrou Hamilton.

"Eu tenho contato frequente com Neymar. Eu tento assistir o máximo que consigo, sempre fui um grande fã. Eu sempre jogo Fifa com meu irmão. Ele escolhe a Inglaterra, e eu tenho que escolher outro time e sempre escolho o Brasil. Vocês têm jogadores incríveis e sei que essa é a grande paixão de muita gente aqui, mas sei que corrida também é. Vocês também têm alguns grandes surfistas aqui, como Gabriel Medina e Ítalo Ferreira. Adoro vê-los, são uma inspiração incrível", prosseguiu.

"Eu estava com 23 anos quando eu ganhei aquele campeonato aqui. Foi um momento especial, mas eu era muito novo. Eu não acho que eu fui capaz de aproveitar aquele momento o tanto que eu gostaria de ter aproveitado. Agora, tenho 36 anos e estou muito mais longe na minha trajetória de vida e muito mais consciente do que acontece ao redor de mim, me entendo melhor, meus valores principais, as coisas pelas quais quero lutar", completou o heptacampeão, agora aos 36.

Lutas de Hamilton

E são muitas as lutas empreendidas por Hamilton - as mais importantes, segundo ele mesmo, estão bem longe das pistas. O piloto é ativo no combate ao racismo sistêmico no automobilismo e em outras instâncias da sociedade. Ao longo dos últimos anos, foi figura importante na campanha "Black Lives Matter" ("Vidas Pretas Importam", na tradução livre). Por meio do projeto "Mission 44", recruta educadores negros nas áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática para aumentar a diversidade nas escolas do Reino Unido e na própria Fórmula 1. "Este ano, um dos meus grandes focos é fazer com que o esporte seja mais diverso, que reflita mais o mundo fora dele. Não apenas na nossa indústria, mas em todas as indústrias pelo mundo", afirmou.

"Acho que essa vai ser a coisa da qual mais vou ter orgulho. Nós estamos só começando, e acho que o início é a educação. Não é só no Reino Unido, é no planeta inteiro. No Brasil, vocês têm uma população negra muito grande. O objetivo da Mission 44 é analisar esses problemas sistêmicos, ver como a gente pode encorajar as pessoas a trabalhar nisso e criar igualdade. É o que a gente quer. Qualquer jovem do planeta tem o mesmo direito de ter educação. As famílias não devem pensar que 'essa profissão não serve para o meu filho, porque não tem como ele entrar nessa área, não tem ninguém que parece com a gente nesse setor'. A representatividade é uma questão muito importante", prosseguiu.

E as preocupações de Hamilton se estendem a questões ambientais. O piloto pontuou a necessidade de a F1 acelerar os processos de redução da emissão de carbono e ser mais sustentável em meio ao avanço do aquecimento global. Para ele, porém, as transformações também passam pelo dia a dia das pessoas e, claro, as adesões dos governos nacionais. Nesse cenário, lamentou a acelerada devastação da Floresta Amazônica no Brasil.

"É ótimo ver o esporte lidando com isso com seriedade e realmente tentando ser parte da solução. Tudo começa com educação, com crianças. Há governos e pessoas no poder que não entendem isso completamente ou não estão juntos na causa. Eu gosto de pensar que isso vem com educação, mas nós precisamos ter mais governos preocupados com isso. Por exemplo, aqui é triste ver algo que sempre aparece no meu telefone, que é a floresta tropical sendo destruída", destacou o inglês, que leva o Brasil não apenas na cabeça, mas também no coração.